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"Voltou a usar heroína e foi à TV ganhar dinheiro"
ESPECIAL PARA A FOLHA
Foi o jornalista alemão Kai Hermann quem, ao lado do colega
Horst Rieck, recolheu o depoimento de Christiane F. em 1978,
quando ela tinha 15 anos. Antes
de virar livro, a história de Christiane foi publicada em série pela
revista "Stern", onde Hermann
permanece escrevendo, hoje como free-lancer.
Aos 63 anos, o jornalista publicou outra obras, nenhuma delas
com tanto sucesso quanto "Wir
Kinder vom Bahnhof Zoo"
-"Nós, as Crianças da Estação
do Zôo", nome original do livro,
que para ele não perdeu o impacto após tanto tempo. "Acho que
continua chocante", disse à Folha, por telefone, de Hamburgo.
Hermann conta que Christiane
alternou, neste meio tempo, períodos longe e perto da heroína.
Da última vez que a viu, tinha tido
uma filha e estava "limpa".
Leia a seguir trechos da entrevista.
(CM)
Folha - Como o sr. encontrou
Christiane?
Kai Hermann - É uma longa história. Estávamos fazendo uma reportagem sobre jovens que dormiam nas ruas. Eu não sabia muito sobre heroína nessa época, e
crianças de rua eram um fenômeno novo na Alemanha. Tivemos
encontros com Christiane durante mais de um ano. Ela estava
"limpa" de heroína e vivia com
uma tia em um vilarejo. Nos encontrávamos durante quatro, cinco dias por semana, e ela nos contou sua história. No começo, ninguém queria publicar o livro.
Folha - E se tornou um sucesso.
Hermann - Foi o número um da
lista de best sellers da Alemanha
durante dois anos. O filme também foi um sucesso. E o livro continua vendendo.
Folha - Como é a situação hoje?
Ainda há adolescentes vivendo como ela?
Hermann - Sim. Nos mesmos lugares de Berlim onde se passa a
história ainda há problemas com
drogas.
Folha - Na época em que o livro
foi lançado, o Muro ainda estava de
pé. Depois que caiu, isso melhorou?
Hermann - Eu acho que piorou.
Folha - O que aconteceu com
Christiane?
Hermann - Ela esteve longe das
drogas por cinco anos depois de o
livro ser publicado e vivia com
um músico alemão famoso. Depois desse tempo, ela se separou e
começou a tomar heroína de novo. Esteve na cadeia por um ano
-eu não vou contar o que aconteceu porque não tenho o direito
de falar tudo sobre ela. Na cadeia,
ela passou períodos usando e sem
usar drogas. Agora tem uma filha
de 3 anos e, da última vez que a vi,
não tomou drogas.
Folha - Por que ela revelou sua
identidade?
Hermann - Nos primeiros anos,
só os amigos mais íntimos dela
sabiam, mas, depois que voltou a
usar heroína, ela foi à TV e coisas
assim para ganhar dinheiro.
Folha - O sr. continua a ter contato com ela?
Hermann - Infelizmente não
com regularidade. Há dois anos
não tenho nem mesmo seu número de telefone. Faz um ano e
meio que não a vejo.
Folha - O livro fez o sr. e seu parceiro ricos, ou Christiane?
Hermann - Não exatamente. Os
direitos estão divididos entre nós
três, então... Não.
Folha - Após todo esse tempo, e
de histórias como a do filme
"Trainspotting", por exemplo, o livro continua chocante?
Hermann - Sim, pelo menos na
Alemanha. Acaba de ser feita aqui
uma edição de bolso e vendeu
quase 100 mil cópias, então deve
continuar interessando aos jovens de hoje. Acho que continua
chocante para a maioria deles.
Folha - Aqui no Brasil, a história
de Christiane chocou, mas depois
dela houve muitas outras de prostituição infantil, garotas de 9 anos
grávidas, crianças fumando crack
na rua...
Hermann - Eu acho que a grande
razão do sucesso do livro não é o
vício em drogas ou a prostituição,
mas o fato de Christiane ser uma
garota como qualquer outra, como qualquer jovem. As pessoas
podem se identificar com ela.
Acho que esse é o ponto principal.
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