São Paulo, quarta-feira, 28 de março de 2007

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Tiros em Michael Moore

"Fabricando Polêmica", que passa amanhã em SP, aponta manipulações nos filmes do diretor americano

Divulgação
Diretor é tema de filme canadense dirigido por casal


LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Porta-voz dos sindicalistas em "Roger e Eu", pacifista em "Tiros de Columbine" e democrata de carteirinha em "Fahrenheit 11/9", Michael Moore seria também ficcionista diletante? É essa a pergunta que levanta o casal de cineastas Rick Caine e Debbie Melnyk (ele, americano; ela, canadense; ambos de esquerda, o que dá um sabor especial à tentativa de desmontar o "mito" Moore) no documentário "Fabricando Polêmica". Ali, questionam os métodos do cineasta e elencam distorções e "aproximações da verdade" de que ele se vale para fundamentar teses inflamadas.
Programado para amanhã, às 19h, no Cinesesc, em São Paulo, e exibido hoje no Rio (18h, CCBB), dentro do cardápio do festival É Tudo Verdade, o filme foi concebido como um tributo ao polêmico diretor. "Éramos fãs dele. Achávamos os seus filmes ótimos", disse Caine à Folha, em entrevista por telefone. "E somos gratos a ele, por fazer com que as pessoas fossem ver documentários", observou Melnyk.
Apesar disso, o documentário já começa batendo no cineasta. Numa das seqüências de abertura, amigos de infância, ao comentar a relação com Moore, destacam esquisitices como sua tendência à paranóia e à megalomania. Em seguida, os diretores apontam fraudes em "Roger e Eu" (a figura-título concedeu, sim, entrevista a Moore, ao contrário do que se vê no corte final) e "Tiros em Columbine" (os canadenses, no fim das contas, não se sentem tão seguros assim...).
O título do filme ajuda a questionar a tal condição de "admiradores" do casal. "Nossa intenção foi fazer uma crítica honesta da técnica de documentário de Moore e de como ele tenta provocar mudanças políticas com isso", diz Caine.
No filme, o abandono do tom chapa-branca corre em paralelo a um crescente desencantamento em relação a Moore. As tentativas de entrevistá-lo durante a turnê de lançamento de "Fahrenheit 11/9" são invariavelmente malsucedidas.

Verdade esmigalhada
Mas Caine ainda vê virtudes em Moore. "Ele busca uma verdade maior, no sentido de provocar uma transformação cultural nos EUA. O que questionamos é se é preciso fazer essas pequenas distorções, contar essas pequenas mentiras no caminho para apresentar a verdade maior. Qual o valor dela, se foi se esmigalhando pouco a pouco?", questiona. "É como diz um dos ativistas no filme: "mentiras são contadas pela CIA e por George Bush." Como você se diferencia disso? Os fins não podem justificar os meios", completa Melnyk.
Alguns críticos ouvidos pelo casal afirmam que Moore se vale da associação que o público faz entre documentário e verdade para inserir truques e comentários furtivos. Caine concorda que transformar o que seria um filme-tributo em investigação dos métodos de Moore também é abrir espaço à subjetividade, mas ressalva: "Não discuto que a objetividade absoluta não existe. Mas há uma restrição: deve se tratar da verdade ou de uma tentativa de relatá-la. Você não deve fazer com que os fatos se encaixem na sua história. Deve sair em busca dos fatos e, a partir daí, definir a sua história".
As próximas histórias do casal já estão definidas: preparam uma ficção sobre o crítico musical Lester Bangs e um documentário sobre inserções de merchandising em programas de TV e filmes.
Quanto a Moore, dedica-se ao documentário "Sicko", seu ensaio sobre o sistema de seguro de saúde ianque, a ser lançado em junho deste ano.

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