São Paulo, terça-feira, 28 de maio de 2002

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Garoto problema


"The Eminem Show", o novo disco do polêmico rapper americano, tem lançamento mundial hoje

Ataques verbais nas canções vão contra a ex-mulher, Moby e o governo de George W. Bush



SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Senhoras e senhores, o menino-problema que os Estados Unidos adoram odiar está de volta. Chega hoje às lojas do mundo todo o novo álbum de Eminem, 29, "The Eminem Show", em que o rapper branco amadurece e volta suas baterias contra o governo de George W. Bush.
Com mais palavrões do que dez episódios de "The Osbournes" reunidos, ele ataca o presidente e sua mulher, Laura, o vice, Dick Cheney, e principalmente a mulher deste, Lynne, além do Congresso dos EUA e a Federal Communications Commission (FCC), entidade que regula as letras das músicas na indústria fonográfica.
O militarismo do atual ocupante da Casa Branca é citado aqui e ali, mas é contra a mulher do vice-presidente que a coisa pega. Lynne Cheney foi a única da atual administração a se manifestar diretamente contra as músicas e a atitude do rapper. Levou o troco.
A primeira faixa, "White America", termina com o verso "Foda-se, sra. Cheney!". Mais para a frente, ele brinca com o estado de saúde do marido dela, que já teve vários ataques do coração, além de simular uma execução do próprio no clipe de trabalho.
Natalie Rule, a porta-voz da vice-primeira-dama, disse que sua chefe não vai responder aos ataques pessoais, mas que continuará denunciando "a repetida glorificação que o rapper faz da violência contra as mulheres e os homossexuais. Isso merece ser amplamente condenado".
Nas 15 faixas e cinco vinhetas do álbum magistralmente produzido por Dr. Dre, sobra para mais gente além dos políticos, principalmente na classe artística. Nesse sentido, Eminem é o anti-Caetano Veloso do pop: quando cita alguém numa música, é sempre de maneira negativa. Assim, para ficar em apenas alguns, seus novos alvos são Elvis Presley, Eddie Murphy (e o episódio em que foi preso com um travesti), Marilyn Manson e Michael Jackson. Mas o pior sobra para o músico Moby, que é chamado de "velho careca", convidado a protagonizar uma felação com o rapper e ouve que "ninguém mais liga para o tecno".
Numa entrevista a uma emissora de rádio londrina, o rapper de Detroit (Michigan) já havia deixado bem claro sua bronca: "Eu não suporto tecno. Não importa o quão bom Moby seja, isso não muda nada. Não que ele seja bom em alguma coisa...". O autor do recém-lançado "18" ainda não se manifestou a respeito.

Autocrítica
Que não se pense, porém, que o segredo do sucesso de Eminem seja a polêmica pela polêmica. Ele importa porque fala sem medo muito do que todo mundo pensa, seja politicamente incorreto ou desagradável. Inclusive sobre ele mesmo, por pior que seja.
Já na abertura do álbum, na seminal "White America", está explícita a razão de seu sucesso: ele vende (30 milhões de cópias até agora) porque é um rapper branco e atinge diretamente os meninos de subúrbio que, de outra maneira, não consumiriam o gênero e não encontram resposta para suas angústias em babas como Backstreet Boys e 'NSync.
E não pense que passagens polêmicas de sua vida ficaram de fora de "The Eminem Show". Do processo que sua mãe moveu contra ele por difamação às duas condenações por porte de armas, está tudo aqui. Na vinheta "The Kiss", por exemplo, ele reencena o episódio em que ameaçou matar o sujeito que beijava sua ex-mulher e o levou à prisão.
Em outras duas passagens, brinca com os rumores de que teria namorado a cantora Mariah Carey. "O que, você não me leva a sério? Eu, fumar crack? Antes disso, prefiro implorar para que Mariah me aceite de volta."
Além de mais seguro nas letras e evoluído musicalmente, o rapper deixou (um pouco) de lado um dos aspectos mais desagradáveis de sua carreira, que era a homofobia. Pode ser reflexo do dueto que fez com Elton John no último Grammy (o britânico, aliás, ganha citação também, mas positiva), pode ser a idade.
A misoginia estúpida, porém, continua latente e domina talvez não por acaso as piores músicas, justamente as que têm rappers em participações especiais, como se fosse uma maneira de o menino branco se reafirmar e mostrar que também é "da turma". Assim, a ex-mulher reaparece para ser crucificada numa música que rima "tampax" com "antraz".
"The Eminem Show" chega às lojas duas semanas antes do previsto, como manobra da gravadora Universal para tentar minimizar os efeitos da pirataria, já que o álbum inteiro pode ser encontrado em versão pirata na internet há alguns dias.
Nesse ponto, Eminem fecha calado com a indústria que ele supostamente despreza: "Não importa quem colocou meu CD na internet, eu quero encontrar esse filho da puta e espancá-lo de verdade", disse ele.



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