|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MÚSICA
Megaevento que leva a marca brasileira à Portugal mistura artistas de tendências conflitantes; Paul McCartney é destaque
Lisboa recebe Rock in Rio esquizofrênico
COLUNISTA DA FOLHA
A começar pelo nome engraçado, de um festival de rock que é
"in" Rio, mas acontece em Lisboa,
o Rock in Rio-Lisboa se mostra
gigante, megaestrelado, mas ainda assim é difícil entender a quem
ele possa interessar, seja no Rio,
em Lisboa, no Brasil, em Portugal,
na Europa. A questão é de identidade, não só geográfica.
O evento de seis dias e dois finais de semana que começa hoje
põe tempero brasileiro no continente dos festivais. Mas esse tempero rende um caldo ralo, resultado de um elenco esquizofrênico,
que aponta para lugar nenhum.
É um megafestival que migra de
um país continental carente de
megafestivais para um continente
inflacionado de eventos musicais
de tal porte. Para os brasileiros, o
Rock in Rio Lisboa e suas mais de
80 atrações não vão render mais
do que um programa de melhores
momentos na Globo. Para os lisboetas, em particular, é o festival
de mais de 80 atrações e 90 horas
de duração que vale por levar à cidade o músico Paul McCartney.
Essa é a primeira vez que o ex-beatle se apresenta ao vivo em
Portugal, em 40 anos de carreira.
Mas, no meio do "padrão europeu" de festivais de verão, o Rock
in Rio Lisboa pousa como um ET.
Talvez até essa seja a intenção do
evento, mas o RRL não prima por
juntar uma platéia de gosto coerente. Headliners como Peter Gabriel e Sting, que não lançam discos significativos há anos, dificilmente serão chamados para algum outro festival neste ano.
É missão quase impossível
prender, por três shows que seja,
uma pessoa de gosto musical
qualquer diante do palco principal no domingo. O bluesman português Rui Veloso abre os trabalhos e antecede o veterano brasileiro Gilberto Gil. O ministro sai
para o palco ser varrido pelo hard
rock setentista dos moleques australianos do Jet. Em seguida, entra
o som "maduro" e mainstream de
Ben Harper. Depois Peter Gabriel
assume seu posto de grande atração do dia. E não deve acordar os
que dormiram depois do Jet.
A idéia do festival em congraçar
artistas portugueses com brasileiros e latinos gerou uma escalação
estapafúrdia, que para quem
acompanha música é um verdadeiro "samba do luso-brasileiro
doido". Alejandro Sànz, Nuno
Norte, Ivete Sangalo, Luis Represas, João Pedro Pais, Moonspell,
Rui Veloso e Charlie Brown Jr.
não combinam num mesmo
evento.
Até a megabanda indie Foo
Fighters, que estava repousando
depois de quase dois anos de turnê, foi chamada para substituir o
Guns n" Roses, que há anos não
consegue se portar como um grupo de rock. A banda de Axl Rose
era o sonho do festival em repetir
a afluência de pelo menos parte
das 250 mil pessoas que estiveram
no evento do Rio em 2001.
A tenda Raízes do RRL, que terá
a veterana brasileira Joyce, é mais
coerente a uma fórmula de festival e contabiliza mais atrações
que o palco principal. Quatro dias
depois que a baiana Daniela Mercury encabeça a noite em que
Britney Spears "abre" para a brasileira, a mesma Lisboa abriga o
Super Bock Super Rock, com
atrações pop relevantes, como Pixies, Fatboy Slim e N.E.R.D..
Ainda em junho, o britânico
Glastonbury também vai promover um show de Paul McCartney.
Tal qual o RRL, também vai dar a
seu público de mais de 120 mil
pessoas/dia atrações como Kings
of Leon e Black Eyed Peas.
Como um olhar menos ligado à
emergência do pop, o RRL, com
sua idéia da propagação da marca
talvez até faça sentido. Num campo hipotético, se o Reading Festival fizesse uma versão em SP, talvez pudéssemos esperar aqui uma
atração como o Radiohead, por
causa do nome do festival. De repente o título Rock in Rio chama
mais público do que Rock in Lisboa. Porque em Lisboa talvez Daniela Mercury seja artista para
competir com a banda de Thom
Yorke.
(LÚCIO RIBEIRO)
Texto Anterior: Popload: Banda matadora, texto matador Próximo Texto: Música/crítica: Em novo álbum, PJ Harvey aparece com a "boca suja" Índice
|