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ARTES PLÁSTICAS/CRÍTICA
Objetos de Farnese de Andrade revelam universalidade
FELIPE CHAIMOVICH
CRÍTICO DA FOLHA
Farnese de Andrade (1926-1996) foi iconista. A retrospectiva de seus objetos no Centro
Cultural Banco do Brasil traz à cidade 130 peças que iluminam o
obscuro universo criativo do artista mineiro. Bonecas, oratórios e
insetos gigantes combinam-se em
cápsulas do tempo, alternando lirismo e abjeção.
Nascido em Araguari, ele se iniciou na arte como aluno de Guignard, em Belo Horizonte, entre
1944 e 1948. Do mestre, preservou
a mistura entre surrealismo e
imaginário mineiro, levada para o
Rio de Janeiro, onde residiu a partir de 1949. No começo da produção, trabalhou majoritariamente
sobre papel, principiando a pesquisa com objetos em 1964.
Os temas arquetípicos são recorrentes: morte, nascimento,
mãe, pai, eu. Para figurá-los, o artista desenvolveu um método de
buscar pela cidade maravilhosa
coisas pré-existentes, cujo arranjo
como acumulação revelaria sentidos ancestrais.
Ele andava pelos bricabraques
do centro do Rio, nos quais adquiria quinquilharias de toda sorte, e pelas praias cariocas, onde recolhia restos de madeira e outros
destroços devolvidos pelas ondas.
Os elementos colecionados pelo
artista descansavam no ateliê, até
encontrarem destino, fosse como
habitantes de caixas e armários ou
como fósseis em moldes de resina
transparente.
Seu olhar compositivo descobria repetidamente imagens da
origem ao juntar tantas partes. As
"Anunciações" ganham, por vezes, contornos delicados, como
na assemblagem de uma cabeça
feminina careca com um boneco
plástico inserido em medalhão de
resina, defronte ao anjo de madeira (1982).
Outras se fecham em hermetismo, como na justaposição de uma
esfera de vidro na barriga de uma
delicada boneca de madeira, da
foto de uma criança e de dois pés
deitados (1983-95).
Na série "Viemos do Mar", corais simulam órgãos de bonecos
aos pedaços, imersos em invólucros translúcidos.
A crueldade é exercitada sobre
os membros apropriados. Em "O
Alimento" (1985), dois bonecos
plásticos de bebês engatinhando
foram queimados, e os corpos retorcidos compartilham a refeição
de um ovo com monstruoso besouro do mesmo tamanho que
ambos, todos os três apoiados sobre uma carapaça emborcada de
tartaruga.
Por outro lado, as peças menos
narrativas parecem exercício inacabado. A "Cimitarra" (1978) é
coluna de madeira encimada com
ponta curva, aparentando conservadora escultura sobre pedestal.
Todavia, mesmo nesses casos, é
possível enxergar sentidos ocultos, como na mesa com pés torneados sobre a qual se apóiam outros três pés torneados invertidos:
acima como abaixo.
A presença desses objetos está
no enigma. Embora sua construção seja idiossincrática, transparecem universalidade. O mergulho no inconsciente é o único critério de qualidade da obra surreal:
Farnese de Andrade se jogou de
peito aberto.
Farnese: Objetos
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Álvares Penteado, 112, Sé, tel. 3113-3651)
Quando: ter. a dom., das 10h às 21h. Até 19/6
Quanto: entrada franca
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