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GUILHERME WISNIK
A nuvem financeira e o skyline
Empresas alugam edifícios comerciais e criam um ciclo predatório em que o lucro vive do antiplanejamento
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"A RENTABILIDADE do mercado financeiro com a segurança do mercado imobiliário" era a promessa miraculosa
anunciada com a globalização dos
anos 90, acompanhando a transformação de edifícios em títulos financeiros. Como é que, a partir de então, o capital se urbanizou em São Paulo? Os fundamentos desse processo
são brilhantemente analisados por
Mariana Fix em "São Paulo Cidade
Global" (Boitempo, 192 págs., R$
38), livro que será lançado quarta-feira no restaurante Soteropolitano
(r. Fidalga, 340, às 19h).
No início da década passada, com
a estabilização monetária, a desindustrialização, a entrada maciça de
capital estrangeiro e a grande transferência patrimonial (privatizações), até a produção de imóveis
passou a ser regida por mobilidade e
liquidez. Na prática, as grandes empresas deixaram de se estabelecer
em sedes próprias, pensadas historicamente como patrimônios sólidos,
e passaram a alugar andares de edifícios comerciais, podendo se deslocar com mais facilidade no território. Já os novos proprietários, nesse
esquema, deixaram de ser os empreendedores tradicionais, tornando-se, doravante, investidores anônimos, como os fundos de pensão.
Assim, enquanto as empresas se
beneficiam com a maior flexibilidade (podem aumentar ou diminuir
seus quadros bruscamente, ou simplesmente abandonar o local, a cidade e o país), os investidores lucram à medida que um mercado se constitui como "novo vetor" de valorização imobiliária, em áreas com terrenos inicialmente baratos (vizinhos
de favelas, com modesta infra-estrutura) que se tornam focos de grandes obras do governo. Tal é o caso
paradigmático do eixo Faria Lima-Berrini-Marginal Pinheiros, para o
qual foram canalizados cerca de
85% dos investimentos públicos da
cidade na década passada.
Esses novos edifícios corporativos
de alto padrão são, portanto, como
mostra Fix, "bases hospedeiras" para o capital transnacional em errante migração, realizando-se muitas
vezes como enclaves globais em
meio a metrópoles periféricas. Seu
estudo se completa apontando a fratura desse processo local de globalização, uma vez que em São Paulo a
aliança entre mercado imobiliário e
de capitais se mostrou imperfeita,
truncada, dada a inexistência de um
sistema de crédito efetivo no Brasil,
como é o de hipotecas nos EUA.
Assim, com as crises econômicas
mundiais da segunda metade da década, mais a diminuição do ciclo de
privatizações, o mercado imobiliário corporativo de São Paulo viveu
uma crise de superoferta, assistindo
a uma enorme queda nos preços e
aumento na taxa de vacância dos
imóveis, afugentando os investidores. É quando incorporadoras emblemáticas como a Birmann acabam
quebrando.
O resultado é uma paisagem fantasma que arrebenta a infra-estrutura da cidade, num ciclo predatório
em que o lucro vive do antiplanejamento. Ironicamente, esse processo
de enorme concentração de renda e
segregação espacial é financiado pelo Estado e por fundos em cuja origem está a histórica contribuição
dos trabalhadores.
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