São Paulo, segunda-feira, 28 de maio de 2007

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Projeto retrata cidades sem cinema

"Revelando os Brasis" estimula a produção de vídeos em formato digital em lugares com menos de 20 mil habitantes

Muqui, ao sul de Vitória, transforma ermitão das cavernas em "herói" local; exibições chegam a 60 localidades até 27 de julho

Divulgação
O diretor Ériton Berçaco e o protagonista do seu documentário, Brilhantino; vídeo abriu em Muqui projeto "Revelando os Brasis"

CÁSSIO STARLING CARLOS
ENVIADO ESPECIAL A MUQUI (ES)

Nem "Piratas do Caribe - No Fim do Mundo" nem "Homem-Aranha 3" nem "Shrek 3". O personagem-herói que todos queriam ver atende pelo nome de Brilhantino. Pelo menos foi assim na noite da última quinta, na praça principal da pequena Muqui (170 km ao sul de Vitória), quando retornou à origem o projeto "Revelando os Brasis". Resultado de uma parceria entre a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura e o Instituto Marlim Azul, o programa estimula e viabiliza a produção, em cidades com até 20 mil habitantes, de vídeos em formato digital.
Diante de uma enorme tela montada ao ar livre, milhares de habitantes da simpática Muqui se juntaram para assistir a quatro trabalhos feitos por cineastas amadores e/ou estreantes capixabas.
"Brilhantino", o filme de abertura, dirigido por Ériton Berçaco, 27, estudante de pós-graduação em estudos literários nascido em Muqui, registra a rotina de João José Brilhantino, 74, que há mais de 30 anos vive em uma caverna na região.
"Desde criança eu via o Brilhantino andando pelas ruas e enxergava nele um daqueles personagens de desenho animado ou de filmes de fantasia.
Mas no documentário eu quis mostrar o tanto de humano que há por trás de uma figura que a cidade enxerga como bizarro", explica o diretor.
Com enquadramentos inusitados e o uso coerente da câmera baixa, Berçaco agiganta seu personagem, lançando-o numa dimensão mítica, a das histórias locais que toda pequena cidade ainda guarda.

Tradições esquecidas
Os outros vídeos apresentados em Muqui também buscavam a idéia de resgatar histórias ou tradições locais pouco conhecidas ou condenadas ao esquecimento.
"O Sonho de Loreno", dirigido por Alana Almondes, de Mantenópolis, registra a vontade de cinema na figura do cineasta amador Seu Manoelzinho, dono de extensa filmografia feita em vídeo e protagonizada por amigos e parentes. "Bate-Paus", de Jorge Jacob, da cidade de Vila Pavão, mostra situações de ódio racial vividas pela comunidade de imigrantes pomeranos e seus descendentes na região capixaba.
E "O Último Tocador", de Valbert Vago, de São Roque do Canaã, conta a história de um instrumento musical local, a concertina.
Para os moradores de Muqui, a experiência teve forte teor simbólico. Primeiro, porque a cidade perdeu seu único cinema há mais de 30 anos. Depois, porque reencontrou o encanto da projeção em tela grande com um personagem que todos ali conhecem.
"Eu nem gosto de ver filmes na TV, mas, desse jeito bonito e com uma história de gente de verdade, eu queria ver sempre", afirma a doméstica Maria Alexandrina Araújo.
"Achei emocionante assistir ao lado de toda essa gente. Isso aproxima nossa comunidade", diz o operário de construção civil Santo Gomes Figueira.

Em SP em junho
Depois de Muqui, o projeto segue para outras 60 cidades até o dia 27 de julho. Em São Paulo, as projeções serão feitas nas cidades de São Luiz do Paraitinga, Monteiro Lobato e São Paulo nos dias 7, 9 e 11 de junho, respectivamente.

O crítico CÁSSIO STARLING CARLOS viajou a convite do Ministério da Cultura

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