São Paulo, sábado, 28 de maio de 2011

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TRÉPLICA "TITÍLIA E O DEMONÃO"

Jornalista defende dogma e abre mão do senso crítico

PAULO REZZUTTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Oscar Pilagallo afirma, no texto da Ilustrada de 21 de maio sobre o meu livro "Titília e o Demonão - Cartas Inéditas de d. Pedro 1º à marquesa de Santos", lançado pela Geração Editorial, não gostar de história mal contada.
Porém, age diversamente ao comprar "at face value" que a marquesa de Santos "cobrava propinas e praticava extorsões para viabilizar negócios e assegurar nomeações", como pregavam seus detratores.
Lembra a ladainha do velho conselheiro Drummond, para citar apenas um deles: afirmava mil tramas envolvendo Domitila sem apresentar qualquer prova, ora porque as perdeu, ora porque pegaram fogo.
Ao invés de copiar os inimigos da marquesa, de d. Pedro 1º e da monarquia, o que provavelmente agradaria Pilagallo, tratei com ceticismo as fontes primárias a respeito do casal, levando em conta os interesse políticos da época e as circunstâncias em que foram ditas.
Análise essa que será aprofundada na biografia de Domitila, mas já esboçada em "Titília e o Demonão" como demonstra qualquer leitura menos seletiva.
Quanto à carta em que o imperador nega favores à amante, essa não é a única prova existente de que ele tratava público e privado separadamente.
No meu livro existem mais amostras desse comportamento. Somadas a inúmeras outras, demonstram como são tendenciosas as pesquisas que tratam do casal, influenciadas até hoje pelo "desmonte" de 1889.

NEGOCIATAS
Incrível como nenhuma das 157 cartas conhecidas anteriormente ou das 94 que descobri trata de negociatas. Estas devem ter sido calcinadas no mesmo incêndio que atingiu as "provas" do conselheiro Drummond.
Quando Domitila foi nomeada dama da imperatriz, passou a receber, como as demais, pagamento por decreto. Além de joias, d. Pedro comprou propriedades para ela, recompradas por ele quando da saída da marquesa do Rio.
Domitila possuiu diversos negócios na corte, até exploração de transporte fluvial. Inegável que sua convivência junto ao poder lhe abriu portas para fazer bons negócios. Mas daí julgar que d. Pedro deixaria se levar por propinas recebidas pela amante para nomear alguém?
A influência dela da marquesa de Santos nem mesmo conseguiu fazer valer as isenções que seu título de nobreza garantia. No exílio, d. Pedro 1º penhorou joias e a baixela dos Braganças para "andar de camisa branca e engomada sem dever nada a ninguém".
O imperador não era corrupto. Como funcionaria a venda de nomeações sem sua participação direta? Não funcionaria, pois não existiu. Durante os sete anos em que viveu na corte, Domitila foi o bode expiatório dos males brasileiros: queda de ministros, morte da imperatriz, escravidão e guerra.
Quase 200 anos depois ainda sofre com argumentos como o abraçado por Pilagallo: "A historiografia (...) é farta em relatos sobre os negócios escusos da marquesa", ou seja, ela fez isso pois todos dizem que fez. Recorrer a isso é abrir mão de senso crítico.

PAULO REZZUTTI é autor do livro "Titília e o Demonão" (Geração Editorial)


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