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LIVRO - LANÇAMENTO
"Grande Capital" chega atrasado e com problemas
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília
Problemas de tradução, a respeito dos quais editora e tradutor se
desentendem, prejudicam o atrasadíssimo lançamento no Brasil de
um dos romances mais influentes
do século, "O Grande Capital"
(1937), último volume da trilogia
"USA", de John Dos Passos.
A editora Rocco, que pusera no
mercado os dois primeiros livros
no final da década de 80 ("Paralelo
42"/1987, e "1919"/1989), levou dez
anos para completar a obra.
Ao menos, tratou de recolocar
nas livrarias os romances iniciais
junto com o fecho do ciclo.
Mas, estranhamente, apareceram na edição de "O Grande Capital" algumas impropriedades (como a manutenção sem critério
aparente de alguns trechos em inglês) pelas quais o tradutor Marcos
Santarrita se eximiu de responsabilidade, ao falar à Folha.
Santarrita afirmou não ter tido
controle sobre a edição do material
que traduzira 13 anos atrás.
Disse não ter visto as provas e
não ser o autor da introdução. Santarrita declarou ter localizado os
originais de sua tradução e que neles todos os trechos agora editados
em inglês haviam sido traduzidos.
Eliane Lobato, gerente de comunicação da Rocco, por seu lado, declarou à Folha que "textos de Marcos Santarrita nunca são mexidos"
e nega ter havido alteração.
Esse inconveniente não tira a importância histórica de finalizar a
edição no Brasil da trilogia.
Dos Passos (1896-1970) fazia parte do grupo de escritores formado
em Harvard pouco antes da Primeira Guerra Mundial (integrado,
entre outros, por Ernest Hemingway e E. E. Cummings).
Embora tenha produzido outros
trabalhos, inclusive a trilogia "District of Columbia" (1952), esse norte-americano descendente de portugueses ganhou celebridade por
causa de "USA". Jean-Paul Sartre
chegou a chamá-lo de "o maior escritor de nossos tempos".
Dois motivos justificam esse entusiasmo por "USA": engajamento
político e inovações formais.
Dos Passos denunciou com vigor
as injustiças do capitalismo nos
EUA nos anos 30, período de grande polarização ideológica.
A esquerda européia, da qual
Sartre era um dos expoentes, vibrava ao vislumbrar aliados na outra margem do Atlântico. Daí, em
parte, seus elogios exagerados.
Em "USA", Dos Passos introduziu técnicas de narrativa nunca antes experimentadas e inspiradas
por novidades tecnológicas e científicas daquele momento histórico.
A trama da história é interrompida por edições do "jornal da tela"
(notícias de fatos da época da narrativa -1900 a 1935- na forma de
um cinejornal), pela descrição cinematográfica de eventos (sob o título de "o olho da câmera"), pela
biografia de personagens reais ou
fictícios, pelo uso da técnica freudiana de associação livre.
Esses efeitos produziram vívida
impressão sobre o público da época, fascinado com os espantosos
avanços que o início do século lhe
oferecia (cinema, psicanálise, aviação, dadaísmo, telefonia).
Em 1999, esses "gimmicks" já
não impressionam tanto e a desideologização universal tira muito
do encanto romântico que a denúncia do capitalismo de Dos Passos inspirou aos contemporâneos.
Mesmo quando comparado estilisticamente a seus "concorrentes"
da época, os maneirismos de Dos
Passos não impressionam tanto.
O britânico Aldous Huxley
(1894-1963), por exemplo, introduziu em "Contraponto" (1928) e
"Sem Olhos em Gaza" (1936) características de estilo muito mais
marcantes e influentes.
Em "Contraponto", Huxley cruzava, num mesmo capítulo, os destinos de personagens diversos, em
ambientes e em cenários diferentes. Em "Gaza", acrescentou contrapontos temporais aos espaciais.
O fato de as novidades de Dos
Passos terem se esgotado em si não
diminuem a importância ou a qualidade de seu trabalho. Mas a relativização que a distância de 60
anos oferece permite colocá-lo em
sua devida dimensão literária.
Avaliação:
Livro: O Grande Capital
Autor: John Dos Passos
Lançamento: Rocco
Quanto: R$ 48 (544 págs.)
O colunista
José Simão está em férias
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