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São Paulo, segunda-feira, 28 de julho de 2003

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LITERATURA

Escritor mostra nova faceta ao lançar antologia com poemas publicados em livros anteriores e agora modificados

Carpinejar arrisca a poesia em carne viva

ROGÉRIO EDUARDO ALVES
DA REDAÇÃO

Sob o rótulo antologia, Fabrício Carpinejar, 30, acabou por compor o livro inédito "Caixa de Sapatos", que reúne poemas já publicados e agora modificados pelo escritor. Dessa opção pela auto-releitura de seus quatro títulos anteriores, surge, mais do que um novo volume, uma outra face do poeta.
O que se perde nesse lançamento são as linhas ficcionais que garantem a marca pessoal da literatura de Carpinejar e dirigem os textos originais como que compondo os capítulos de um longo romance. Nessa "Caixa de Sapatos", não aparecem os personagens que particularizam a voz do "eu lírico" em cada um dos livros individuais, assim como não se faz referência aos criativos contextos poéticos construídos.
"Eu queria me transgredir, verificar se minha poesia seria capaz de viver sem enredo. Eu realizei um novo livro a partir de minhas obras anteriores, com a mesma serenidade violenta que utilizo com os inéditos. Era um desafio costurá-los sem o contexto que os unifica, sem o protagonista que fazia o papel de bússola na condução da história versificada", afirma Carpinejar de sua casa, em São Leopoldo (RS).
"Se meus poemas formavam algo como a consciência do texto, "Caixa de Sapatos" traduz a inconsciência."
O resultado está próximo da apresentação em carne viva das imagens e pensamentos que serviram de matéria-prima para a confecção das histórias narradas em "As Solas do Sol" (1998), "Um Terno de Pássaros ao Sul" (2000), "Terceira Sede" (2001) e "Biografia de uma Árvore" (2002). "Eu realizo o caminho de volta. Poderia deixar tudo para trás, mas tive a coragem de retomar os lugares de minha sensibilidade e sofrer e rir novamente com eles e me reler com o distanciamento íntimo."

Sem exigências
Os textos mais modificados são os do primeiro volume. "Mudei poemas de "As Solas do Sol" deixando-os mais abertos, tirando as metáforas que sufocavam o andamento musical", diz o poeta. Sem alterações radicais, os versos dos outros livros passaram por processos semelhantes entre si. Na maior parte de "Caixa de Sapatos", lêem-se poemas fundidos a outros, que no original eram subsequentes ou anteriores. Quanto aos cortes, normalmente foram realizados nas partes dos textos que fazem referência ao contexto ficcional original, agora excluído.
Assim composto, "Caixa de Sapatos" quer desvendar um poeta lírico sob sua verve épica.
Mas no processo de feitura desse livro não se poderia desconfiar de alguma exigência da nova parceira Companhia das Letras (seus três últimos livros estão publicados pela editora Escrituras e o primeiro, pela Bertrand Brasil)?
"De nenhuma forma me submeteria a tal exigência editorial. Não trabalho sob encomenda, nem sob pressão externa. Recebi o convite da Companhia das Letras, que coincidiu com meu desejo de enfatizar um diferente aspecto da minha poesia, um escopo mais lírico, cotidiano."
E mudar não parece ser problema para o poeta. Em seu novo projeto, "Cinco Marias", que deve ser lançado em 2004 e continua o enredo de seu romance versificado original, nasce uma nova voz para seus textos, agora feminina. "Senti que a figura feminina estava latejando em minhas obras anteriores, pedindo espaço", diz.
Mais diverso que isso, só a versão em alemão e italiano que seus livros terão em breve. "A mudança de idioma produz um choque salutar. Passei a reparar o poema como alguém desconhecido, que me provoca uma queda-de-braço", conclui.


CAIXA DE SAPATOS. Autor: Fabrício Carpinejar. Editora: Companhia das Letras (www.companhiadasletras.com.br). Quanto: R$ 24 (76 págs.).


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