São Paulo, quinta-feira, 28 de julho de 2005

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COMIDA

Berço do festejado chef Ferran Adrià, região espanhola celebra seu Ano da Gastronomia; veja os pratos típicos de cada Província

Sabor catalão

JOSIMAR MELO
ENVIADO ESPECIAL À CATALUNHA

Você já ouviu falar em Ferran Adrià, o polêmico e cerebral cozinheiro espanhol, o mais famoso da atualidade. Mas o que mais você conhece daquela cozinha que é sua base cultural, a da Catalunha? A Catalunha, capital Barcelona, é um país (como dizem os catalães) que, por acaso, está dentro (ou ao lado) daquele outro país chamado Espanha. Adrià conseguiu uma síntese fantástica: ao mesmo tempo, tem a cozinha mais moderna do mundo e que também mantém suas origens no local onde nasceu. Não que seu berço seja sua única escola. Ele não esconde de ninguém a reverência pelo seu mestre francês, o estrelado Jacques Maximin, com quem trabalhou e que o exortou a usar a inventividade.
Mas este gênio não saiu do nada -veio da Catalunha, que agora, até março de 2006, celebra seu Ano da Gastronomia, com atividades em todas as Províncias (veja programação completa no site www.catalunyaturisme.com). Trata-se de uma cultura cujas raízes remontam ao século 12, quando os limites geográficos e lingüísticos da Catalunha se delinearam. Uma cultura que gerou artistas de outras áreas também (que tal, como exemplos, o arquiteto Antoni Gaudí, o pintor Salvador Dalí e o músico Pablo Casals?).
A tradição gastronômica vem da época em que a Catalunha, dona de uma culinária sofisticada, foi uma das principais regiões gourmets da Europa, no século 19. Esta fica no nordeste da Espanha, espremida entre a França (ao norte) e o Mediterrâneo (a leste), historicamente conectada com França e Itália e dominada pelo mar e pela montanha.
Sua cozinha é a mais documentada da península desde sempre. E, embora sofisticada, tem grande raiz popular.
É verdade que o primeiro chef contemporâneo a ter grande prestígio internacional, Juan Mari Arzak, é do País Basco; mas hoje a Catalunha tem Adrià e vários outros chefs ícones no mundo. Como em toda a península Ibérica, a Catalunha faz uma cozinha do alho e do óleo (o azeite de oliva). Mas tem vários pratos característicos. São molhos típicos como o sofrito (alho, cebola, tomate e salsinha), a samfaina (sofrito de tomate, pimentão e berinjela), a picada (alho, salsinha, amêndoas e pinhões) e o ali oli (azeite e alho emulsionados). Por toda parte se aprecia com orgulho o pa amb tomàquet (o pão esfregado com tomate, azeite, alho e sal), espécie de símbolo nacional -durante a ditadura espanhola de Francisco Franco, quando o catalão era uma língua proscrita, o pão com tomate era visto como uma subversiva manifestação de independência.
Ao longo das Províncias dentro da Catalunha, porém, vão se delineando produtos e pratos típicos de cada localidade. Em Barcelona, são famosos seu cozido (escudella i carn d'olla), que combina uma sopa de fideos (macarrão fino) com arroz e diversas verduras e carnes -aí incluída a butifarra (seu principal embutido). Há também a butifarra con judías (favas), os fideos à la cazuela (com porco e embutidos) e a sobremesa crema catalana (no Brasil, é mais conhecida sua variante francesa, a crème brûlée). A cidade de Barcelona sedia o mais fantástico mercado do país, La Boquería, que fica numa das ruas mais charmosas do mundo, La Rambla.
A Província é também a região onde se produzem os cavas (especialmente em Alt Penedès), vinhos espumantes feitos como o mesmo método usado em Champagne e que vão de produtores de gigantesca envergadura (como Freixenet e Codornìu) a pequenas vinícolas familiares de produtos surpreendentes como a de Agusti Torellò.
Ao norte fica a Província de Girona, bordejando tanto os Pirineus quanto o Mediterrâneo, e esta junção de geografias faz dela a terra do prato Mar i Muntanya, típico da região da Costa Brava, mistura de frango com lagosta que ganhou inúmeras variações de pratos que combinam carnes e pescados. Ao lado das caças e aves da montanha, o litoral tem receitas como o suquet (vários pescados de pedra em caldo denso). É onde fica o restaurante de Ferran Adrià, El Bulli, numa pequena baía próxima à cidade de Roses.
Ao sul, Tarragona é a Província dos arrozes como o rossejat (típico dos marinheiros, feito com caldo de peixes), o arroz negro de sépias e o arroz abanda, cozido com pescados e servido com o molho mais típico da região, o romesco (feito com a pimenta guindilla, azeite e pão). Mas há também bolinhos de bacalhau; a calçotada, feita com um ingrediente fantástico, o calçot (broto comprido e tenro de cebola velha replantada); e os deliciosos vinhos tintos do Priorato e os de outra denominação de origem, Montsant.
E a oeste, no interior, fica Lleida, terra da forte cozinha montanhesa -a cassolada (guisado de legumes e porco), o cozido de cabeça e pé de cordeiro, o arroz de coelho, além de embutidos.


O jornalista Josimar Melo viajou à Catalunha a convite do Escritório de Turismo Espanhol.

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