TVs redobram cuidados com maquiagem e iluminação para tentar atenuar rugas e outras imperfeições da pele dos atores, que se tornaram mais aparentes com as câmeras de alta definição

LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Suzana Vieira, olhe para a lente da verdade e responda: quantos anos você tem?
As câmeras de alta definição, utilizadas na novela "Duas Caras", da Globo, e "Dance Dance Dance", da Bandeirantes, trazem à tona detalhes antes pouco visíveis para o telespectador.
Defeitos no cenário, na maquiagem, rugas e outras imperfeições da pele de atrizes e atores tornaram-se mais evidentes no televisor, apesar do cuidado redobrado de maquiadores, cenógrafos e iluminadores.
Em "Duas Caras", há duas semanas, uma figurante passou de biquíni fio dental em primeiro plano de uma cena que mostrava ao fundo Letícia Spiller à beira da piscina. Com a alta definição, as celulites ganharam seus 15 segundos de fama.
Nos primeiros capítulos, era nítida a maquiagem para reforçar o bronzeado de Antonio Fagundes e seu Juvenal Antena. Os profissionais parecem ter acertado depois em um tom menos falso, mais natural.
Para "Dance Dance Dance", a Band contratou profissionais de cinema. Além disso, fechou convênio com uma empresa de cosméticos que realiza tratamento na pele do elenco. Supervisor de maquiagem da novela, Guilherme Pereira diz que é preciso aumentar a quantidade de base (produto que esconde falhas na pele) e o modo de aplicação. "A alta definição capta tudo, todas as imperfeições da pele. É preciso escondê-las com maquiagem delicada."
"A transmissão com essa tecnologia exige soluções específicas em setores como iluminação, fotografia, cenografia, maquiagem e figurino. A maior resolução faz com que os detalhes fiquem seis vezes mais perceptíveis", afirma Celso Araújo, gerente de operações da Globo e engenheiro responsável pela aplicação da alta definição.
Ele diz que desde o ano passado a equipe técnica está sendo capacitada para trabalhar em "Duas Caras", o primeiro programa do canal totalmente produzido em alta definição. Sobre a evidência maior das rugas e o bronzeado falso de Fagundes, Araújo comenta: "Como a maquiagem tradicional fica muito ostensiva em alta definição, evocando demasiadamente a correção, é necessário usar outras ferramentas. Mas nossos profissionais estão capacitados para isso e têm atingido o resultado esperado".
A Globo continua usando o Baselight, programa de computador que cria uma máscara digital no rosto de atores e atrizes para corrigir defeitos da pele. Utilizado pela primeira vez na rede na novela "Páginas da Vida", rejuvenescia Regina Duarte, 60, que aparecia com uma pele lisa e luminosa. Segundo Araújo, o software é também empregado em "Duas Caras".
Mesmo assim, o efeito disfarce não é tão eficiente quanto o anterior, com câmeras digitais, mas não de alta definição, que dão à TV imagem de cinema.
"Antes era possível rejuvenescer as atrizes em uns dez anos. Agora, por melhor que seja o trabalho, elas chegam a ficar no máximo cinco anos mais novas. Até poderíamos tentar sumir com tudo, mas seria preciso gastar milhões de dólares com profissionais e equipamento e não exibir um capítulo por dia", calcula Del Rangel, diretor de "Dance Dance Dance".

Ditadura da beleza
Premiado diretor de fotografia de cinema e televisão, Carlos Ebert crê que a alta definição trouxe uma nova linguagem à TV, com mudanças positivas. "O detalhamento é muito maior para o espectador. É uma imagem mais realista. Mesmo com muito trabalho, as rugas, por exemplo, podem diminuir, mas sempre vão aparecer mais do que antes. E isso é saudável porque questiona a ditadura da beleza", opina.
Como exemplo, ele cita Renata Sorrah, 60, que está ótima como a romântica e sedutora Célia Mara, em "Duas Caras". "Ela é muito bonita em todas as idades. E é bem assumida como tal. O problema são as atrizes que não assumem a idade, fazem muitas intervenções cirúrgicas e viram monstrengos."
Procurada pela Folha, Sorrah afirmou que "é tranqüila" com o envelhecimento, que nunca fez plástica e o importante é ser "harmoniosa", mas preferiu não se prolongar sobre o tema. Suzana Vieira, 65, antagonista de Sorrah em "Duas Caras", não concedeu entrevista nas duas semanas em que foi procurada, segundo sua assessoria, por falta de tempo.
A psicóloga Rosely Sayão, colunista da Folha, acredita que a mudança pode tornar mais visível o processo de envelhecimento. "Os truques da TV costumam fazer com que as telespectadoras não se identifiquem com atrizes que têm sua idade. Na TV, é possível permanecer jovem e na vida real não. É bom que a sociedade não negue o envelhecimento, que os velhos não precisem se comportar como jovens."


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