São Paulo, segunda-feira, 28 de novembro de 2005

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CLARO QUE É ROCK

Apresentação da banda de rock eletrônico comandada por Trent Reznor fechou o festival com tons sombrios e emoção

Nine Inch Nails explora raiva e fragilidade

SHIN OLIVA SUZUKI
DA REPORTAGEM LOCAL

A tarefa que coube a Trent Reznor, o multiinstrumentista de mão firme sobre sua criação musical que prefere se esconder sob o nome de Nine Inch Nails, não era tão simples assim.
Shows que começam às duas da manhã obviamente já contam com um público mais cansado. Além disso, Reznor não é do agrado de qualquer um: sua eletrônica furiosa e permeada de detalhes, baseada no rock industrial da década de 80, nunca freqüentou as rádios (daqui) e há tempos deixou a programação da MTV (dos EUA e, bidu, também daqui). Para completar, a noite paulista do Claro que É Rock ainda sentia queimar o rastro deixado pela apresentação de Iggy Pop.
Mas Trent Reznor teve inteligência para adequar a escolha das músicas ao momento -o set teve de ser mais curto do que em seus shows habituais- e sensibilidade para equilibrar na ocasião suas principais qualidades: a raiva e o sentimento de fragilidade que se alternam dentro da obra do Nine Inch Nails.
O público foi pego de surpresa pela entrada repentina, seca, com "Wish", um hit do EP "Broken" (1992) que justamente mostra o lado mais furioso do NIN. Sua letra é um dos melhores exemplos do etos da criação de Trent Reznor, explorador em vários tons da descrença em Deus e nas pessoas e da sensação de abandono.
Para o alívio dos que temiam a repetição do som meia-boca no show do Sonic Youth, acontecido momentos antes no outro palco, a parede sonora do NIN aparecia intacta e sem que os instrumentos chegassem embolados. A banda, que tinha o ex-Marylin Manson Twiggy Ramirez, tocava bastante entrosada; solta, mas no limite para reproduzir com fidelidade cada trecho pensado e tocado cuidadosamente em estúdio por Trent Reznor.
Não superaram, no entanto, a surpresa e o impacto causados pela cenografia e pelo jogo de luzes, que justificaram a parafernália de 25 toneladas trazida pela produção ao Brasil. Uma composição feita em linhas retas sob tons -como não poderia deixar de ser- sombrios, com a iluminação funcionando segundo a atmosfera de cada parte do show. A apresentação não seria tão rica como foi sem esse detalhe.
As falhas? A ausência de várias canções em razão do adiantado da hora (principalmente as do álbum "The Fragile") e uma certa falta de reverência do próprio criador ao tocar "Closer", produção que está incluída nos picos de genialidade já atingidos por Reznor.
Deslizes perdoados pela hora em que "Hurt" foi tocada. Johnny Cash (1932-2003), um dos maiores intérpretes da música americana, definiu-a como a composição que melhor definiu o sentimento de um dependente de drogas no fundo do poço, embora a letra seja aberta o suficiente para falar da dor de maneira universal. Aí sim, houve reverência de todas as partes traduzida em um silêncio, geral, de cortar o coração, no meio da música. E certamente não foi um momento em que Trent Reznor se sentiu abandonado.

Avaliação:     

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