São Paulo, segunda-feira, 28 de novembro de 2005

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CRÍTICA

Show do Flaming Lips começa antes da música

LÚCIO RIBEIRO
COLUNISTA DA FOLHA

Tudo bem, o mundo ainda não acabou, afinal você está lendo este texto. Mas não dá para dizer que a banda americana Flaming Lips falhou ao promover no Claro Que É Rock uma espetacular festa pré-apocalipse, como andou propagando o líder Wayne Coyne. O Flaming Lips, esse sim, fez a parte que lhe cabia.
Delícia para os olhos e os ouvidos, o veterano grupo de rock psicodélico de Oklahoma fez um dos shows mais bem-sucedidos do evento, levando em conta que ganhou por completo a platéia de um lugar em que seus vídeos não passam na MTV local, suas músicas não tocam nas rádios e só na semana passada as lojas do país receberam uma edição nacional de um de seus 11 álbuns, "Yoshimi Battles the Pink Robots".
O Flaming Lips já seria uma ótima banda de quatro integrantes tradicionais para um show de rock (guitarra, bateria, baixo e teclados), mas o que se viu no sábado é tudo menos um show tradicional de rock.
Primeiro porque a banda começa seu show bem antes de o som sair de seus instrumentos, em forma de música.
O Flaming Lips entra no palco, toma suas posições, Wayne Coyne caminha de um lado para o outro, conversa com a platéia, afina a guitarra, ajuda a orientar um Exército de ursinhos, vaquinhas e esquilinhos gigantes que transforma o quarteto em um grupo de 30 integrantes.
O telão gigante é armado, balões enormes são inflados, armas de jogar tiras coloridas de papel às alturas são preparadas, papais-noéis correm de um lado e de outro cuidando da tumultuada logística maluca de uma apresentação lipiana. Aí, todo mundo percebeu, a "apresentação" do Flaming Lips já tinha começado havia tempos.
Coyne entrou numa bolha inflável, caminhou (modo de dizer) sobre o público, voltou ao palco e começou a parte sonora com "Race for the Prize", canção sobre dois cientistas que disputam uma corrida para salvar a humanidade -a "salvação humana" é tema recorrente das músicas do grupo.
Trouxe um inspirada cover da ópera-rock do Queen, "Bohemian Rapsody", entoada em coro por todo o público, que serve perfeita para o lado orquestral do Flaming Lips. Emocionou ao narrar a luta da pequena Yoshimi contra os robôs rosas. Tocou com um órgão de brinquedo a música que fala de uma jam entre a vaca e o pato, com direito a muitos "mus" e "qués".
Acredite, até ali a doideira de Wayne Coyne e cia. fazia todo o sentido mesmo para os que no começo do show esboçaram algum "claro que não é rock" para o Flaming Lips.
Mas ainda estava por vir o final arrebatador, com a música da menina que usa vaselina e não geléia no pão ("She Don't Use Jelly"), a emocionante "Do You Realize" e o panfletário-gozado cover que encerrou o show, "War Pigs" (do Black Sabbath), dedicado "às besteiras" de George W. Bush.
Você sabe, o presidente do país que, se de um lado tem um líder que tenta acabar com o mundo, do outro tem uma banda que sempre que pode faz uma maravilhosa "última festa" para o caso de este mundo acabar mesmo.

Avaliação:     

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