São Paulo, sábado, 28 de novembro de 1998

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Apresentadores recebem para defender privatização


Hebe, Ratinho e Ana Maria Braga ganharam cachê para repetir mensagem pró-venda da Telebrás em seus programas, como em um merchandising de guaraná.


APOIO COBRADO
"É o mesmo que eles estivessem falando: "Tome guaraná Antarctica'", afirma membro da organização
ONG pagou R$ 212,6 mil por declarações

IVAN FINOTTI
da Reportagem Local

A opinião de Hebe Camargo custou R$ 9.000. A do apresentador Ratinho, R$ 3.000. Já a apresentadora Ana Maria Braga cobrou R$ 800 por sua opinião.
São esses os valores dos cachês que os apresentadores cobraram para apoiar a venda da Telebrás em seus programas de televisão.
As emissoras também cobraram para que seus artistas falassem. O SBT seguiu seu preço de tabela de merchandising e recebeu R$ 142.500 pelos três minutos em que Hebe discorreu sobre as vantagens da privatização. Já a Record embolsou R$ 55.400 pelas falas de Ratinho e Ana Maria Braga.
O pagamento às emissoras e artistas foi feito pela Associação Brasil 2000, uma ONG (organização não-governamental) criada há cinco meses para fazer uma campanha a favor da privatização do sistema de telefonia brasileiro. A campanha foi desenvolvida pela agência de publicidade DM9. A Folha teve acesso a documentos dessas duas empresas.
Hebe, Ratinho e Ana Maria Braga deram suas "opiniões" sobre a privatização a partir de um mesmo texto, criado por publicitários.
Com algumas variações entre si -cada programa adaptou o texto a seu modo-, a mensagem dos três foi a mesma (leia a íntegra do texto e algumas adaptações dos apresentadores nesta página).
As mensagens foram ao ar nos dias 27 e 28 de julho deste ano. No dia seguinte, 29, aconteceu o leilão que privatizou a Telebrás.
O empresário Sergio Koury de Assis Fonseca, um dos seis membros fundadores da ONG Brasil 2000, disse que a intenção era fazer um "comercial disfarçado de merchandising". "É o mesmo que eles estivessem falando: "Tome guaraná Antarctica. Porque é gostoso! Faz bem à saúde'."
"Como não é um produto", continua, "você não pode dizer que foi um comercial, porque eu não estou vendendo um produto. É uma mensagem".
O total gasto pela ONG nesse merchandising de TV foi de R$ 212.620 -o valor inclui os cachês do trio e o tempo cobrado pelas emissoras. Isso significa 7,5% de todo o gasto da Brasil 2000.
O custo total foi de R$ 2,85 milhões. Quem pagou tudo isso foram as próprias empresas privatizadas: Telesp, Tele Norte Leste e Tele Centro Sul, por exemplo, deram meio milhão cada.
A ONG também pagou radialistas para que fizessem merchandising em seus programas de rádio AM (leia texto nesta página).
Por fim, a parte mais visível da campanha pela privatização foram dois comerciais de 30 segundos exibidos nos intervalos da Globo, SBT, Record, Band e Manchete.
O merchandising é um tipo de comercial exibido dentro dos programas. Em geral, utiliza o próprio apresentador como garoto-propaganda. Prática comum quando se trata de um produto vendável, é usado também em novelas da Globo e em filmes de Hollywood.
Atualmente, Hebe faz quatro merchandising de dois minutos por programa, exibido às segundas, às 22h. O preço é o mesmo cobrado à ONG em julho -ainda que o padrão seja dois minutos de publicidade, e não três.
Assim, são R$ 95 mil para o SBT -negociáveis de acordo com o número de inserções- e R$ 6.000 para a apresentadora -não negociáveis. Segundo o departamento comercial do SBT, a agenda de Hebe como garota-propaganda já está tomada até o fim do ano.
O "Programa do Ratinho" (seg. a sex., às 20h45), que pulou da Record para o SBT em setembro deste ano, também trabalha com um limite de quatro merchandising por programa.
Mas, como ele próprio compra dois desses espaços -para os produtos Viena Hair e In Natura-, sobram apenas outros dois para os empresários interessados. O preço ali é de R$ 60 mil para o SBT e R$ 4.000 para ele.
O merchandising de Ana Maria Braga é o mais barato dos três. Para o vespertino "Note e Anote" (seg. a sex., às 13h) -o programa escolhido pela ONG-, paga-se R$ 15 mil para a Record e R$ 2.000 para ela -tudo negociável.



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