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"Voltei para casa com a nouvelle vague"
Christophe Honoré destaca influências em suas obras de expoentes do cinema moderno francês, como Truffaut e Godard
Diretor diz que em seu filme mais recente, "Canções de Amor", tentou se afastar do kitsch e se aproximar do cotidiano das ruas de Paris
DA REPORTAGEM LOCAL
A seguir, a continuação da
entrevista com o diretor francês Christophe Honoré.
(MARIO GIOIA)
FOLHA - Como você imaginou as
relações familiares de "Em Paris"?
Os pais são separados; há um filho,
Paul, em momento depressivo; há a
irmã ausente, Claire. Aliás, ela tem
um papel central na história, não?
HONORÉ - Ao longo dos filmes,
vou percebendo que, para mim,
a família é o verdadeiro lugar de
minhas histórias. E o que me
interessa é observar como os
sentimentos circulam dentro
da família. Em "Em Paris", especialmente, o sentimento de
tristeza é como o bastão de revezamento que os personagens
vão entregando um ao outro, ao
longo de sua corrida. É verdade
que a ausência, o "buraco" resultante da morte de um dos
membros de uma família, é algo
que está sempre no cerne de
minhas ficções. Claire é o centro de atração em torno do qual
se organizam afetos e comportamentos dos personagens.
FOLHA - Em vários momentos do
longa, há referências aos filmes da
nouvelle vague e de cineastas mais
antigos, como Renoir. Quais foram
suas influências cinematográficas?
HONORÉ - Depois de "Ma Mère" [2004], tive vontade de "dar
prazer a mim mesmo" com um
filme. É o desejo de retornar ao
que alimentou minha cinefilia
e que, ainda adolescente, me
fez sentir vontade de fazer cinema. É o cinema francês, e
principalmente o cinema francês da nouvelle vague, que me
trouxe para onde estou agora.
"Em Paris" não é um filme-homenagem, mas, como o personagem de Duris, sinto que eu
"voltei para casa". Minha casa
cinematográfica. E essa casa é o
cinema francês, de Renoir a
Truffaut, passando por Godard
e Eustache.
FOLHA - Em crítica de "Em Paris", o
diretor de Redação da revista "Cahiers du Cinéma", Jean-Michel Frodon, elogia a demonstração clara de
uma alegria de filmar, um estado de
disjunção geral dos personagens e
as atuações. Também acha que isso
se destaca em seu filme?
HONORÉ - Entendo o que ele
quis dizer. A felicidade de filmar, ou de filmar à francesa: tema pequeno, predomínio do
tom de comédia para tratar de
coisas sérias... E hoje, num cinema francês globalmente bastante queixoso e receoso quanto a seu futuro, isso é quase um
manifesto. No que diz respeito
à disjunção, formalmente, isso
sempre foi minha obsessão.
Amo a variedade nos filmes, o
inacabado, as mudanças de
tom. Acho que já não podemos
nos permitir fazer filmes que
sigam uma nota só ou uma única linha. Para mim, a modernidade e a relação com o real passam pela reconstrução de elementos heterogêneos.
Em relação aos atores, é verdade que, para mim, isso foi
uma descoberta. Minha madrinha foi Béatrice Dalle em "17
Fois Cécile Cassard". Depois
dela, cada um de meus filmes
partiu do desejo de levar determinados atores a filmar.
FOLHA - Em "Canções de Amor",
críticos viram na imperfeição de seu
musical reflexos de "Os Guarda-Chuvas do Amor", de Jacques Demy.
Foi uma influência? E quais os desafios de se fazer um musical romântico em meio ao dia-a-dia de Paris?
HONORÉ - Minha relação com
Demy é sobretudo de caráter
regional. Sou da Bretanha, e
Demy é um dos raros cineastas
bretões. Quando eu era adolescente e ficava deprimido, fechado em meu quarto, o exemplo dele me reconfortava. Eu
me diverti incluindo várias piscadelas em direção a Demy.
"Canções..." é um filme musical porque trata de personagens que são incapazes de exprimir sentimentos. Ao cantar,
conseguem se expressar e, desse modo, chegar ao lirismo.
Eu não queria que esse musical ficasse desligado da realidade, queria evitar a bolha kitsch
ou o real metamorfoseado. Por
isso quis filmar na rua. Escolhi
apartamentos no primeiro andar, para que pudéssemos sempre enxergar a cidade que vive
aos pés dos personagens.
Tradução de CLARA ALLAIN
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