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Folias multiplica por quatro agonia de Querô
Quatro atores se alternam no papel do jovem infrator da obra de Plínio Marcos
Produção dirigida por Marco Antonio Rodrigues, que estreia hoje, tem no elenco participantes de oficinas de interpretação do grupo
LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL
Na primeira fila da galeria de
personagens à deriva de Plínio
Marcos (1935-1999), ao lado da
Neusa Sueli de "Navalha na
Carne" e do Paco de "Dois Perdidos numa Noite Suja", figura
o jovem Querô.
Do romance homônimo de
1976, a história do garoto apresentado no berço à lei do mais
forte migrou para o teatro em
1979 (ainda que o texto só tenha sido efetivamente encenado a partir dos anos 90) e, mais
recentemente, para o cinema
(2007). Na montagem que estreia hoje, em São Paulo, a agonia de Querô se multiplica -em
cada uma das quatro apresentações semanais, um ator diferente encarna o protagonista.
Sob a direção de Marco Antonio Rodrigues ("Orestéia" e "A
Coleira de Bóris"), o elenco é
formado por 41 participantes
das oficinas de interpretação
do grupo Folias d'Arte, realizadas desde julho passado.
O revezamento de intérpretes inclui, além do papel de
Querô, os de Leda (mãe dele,
prostituta que lhe dá o apelido
ao morrer por ingestão de querosene), Violeta (dona do bordel), Ju (prostituta que "adota"
o guri), Tainha (delator) e os
dos policiais que o perseguem.
A dramaturgia segue o fluxo
da memória do jovem. Baleado
num confronto com a polícia,
ele dá a um jornalista um testemunho da perda da mãe, da fuga do reformatório, do jogo de
gato e rato com os tiras e de um
ou outro flerte fugidio.
""Querô" tem muito a ver com
o tema do trabalho do Folias:
êxodos, desterritorialização,
essa ideia de não-pertencimento, de perda de território político, geográfico, afetivo, que deixa o indivíduo órfão e Deus de
si mesmo", diz Rodrigues.
Sem denúncia
Para o diretor, não faz sentido revisitar a obra sob a chave
da denúncia social. "Não queremos esse papel originalmente
jesuíta do teatro brasileiro, de
denúncia, mas sim o de transformar as grandes angústias em
interrogações, matéria-prima
para o trabalho. O que a gente
constata é essa falta de potência, a capitulação geral de sonhos, utopias e quereres."
Espelho desse quadro de desalento, segundo Rodrigues, é o
número de inscritos para participar das oficinas do Folias
-mais de 400 pessoas (para o
que inicialmente seriam 20 vagas, sem remuneração):
"O tamanho do elenco não é
um mérito da montagem, mas
aponta para uma condição difícil do país: o cara não tem o que
fazer, então acaba se vinculando de corpo e alma. Isso por um
lado é bacana, porque as coisas
se reorganizam de outra forma
que não a econômica."
Plínio Marcos encerra a peça
com a imagem do Querô "caído
para sempre ou até o dia em
que ele e outros como ele se ergam das cinzas onde se sufocam". De 1979 para cá, essa segunda hipótese perdeu força,
na avaliação do diretor:
"Pode parecer cético, mas
não vejo possibilidade de reorganização. Há uma questão estrutural, que é o fato de sermos
uma sociedade que pensa como
bombeiro, e não preventivamente. A barbárie, a selvageria
assume um cunho cultural.
QUERÔ, UMA REPORTAGEM MALDITA
Quando: qui. a sáb., às 21h; dom., às
20h; até 26/4
Onde: Galpão do Folias (r. Ana Cintra,
213, Santa Cecília, São Paulo, tel. 0/
xx/11/3361-2223)
Quanto: R$ 30 (R$ 8 para moradores
do bairro)
Classificação: não indicado a menores
de 14 anos
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