Musicadas por Sérgio Molina, canções do compositor serão interpretadas por Miriam Maria no Sesc Avenida Paulista

CARLOS CALADO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Meses antes de morrer, em 2003, o compositor Itamar Assumpção entregou uma missão de risco a um de seus últimos parceiros. Pediu a Sérgio Molina que musicasse dez de suas letras inéditas, para gravá-las com Miriam Maria, vocalista da Orquídeas do Brasil, banda que o acompanhou nos anos 90.
"Ele disse que eu deveria compor as músicas pensando na Miriam como intérprete, para que fizéssemos um CD", diz Molina, que mostra esse repertório inédito a partir de hoje no Sesc Avenida Paulista. Com Miriam e Molina, que toca violão, também estarão a baixista Clara Bastos (ex-Orquídeas), a pianista Mariô Rebouças e a baterista Priscila Brigante.
O compositor conta que havia musicado apenas uma letra de Itamar, quase dois anos antes de receber as novas letras.
"Não Importa", a primeira parceria, também está no show e foi a única das 11 canções da dupla que o autor de "Nego Dito" ouviu antes de morrer.
"Clara entregou essa canção ao Itamar quando ele já estava no hospital. Isso certamente contribuiu para que esse projeto acontecesse", lembra Molina, que acha que "Não Importa" é um pouco diferente das parcerias posteriores. "Ela é mais simples harmonicamente, até porque eu ainda esperava que o Itamar fosse cantá-la."

Cores melódicas
Molina e Miriam gravaram uma "demo" com quatro das canções do show, um ano atrás, com a intenção de obter patrocínio para produzir o CD. A audição dessas gravações revela um Itamar Assumpção diferente. Sua característica poesia ganhou novas cores melódicas e harmônicas, graças às refinadas composições de Molina.
"Nem James Brown" ("vez em quando acordo / com o corpo todo doendo / e o único ungüento é eu cair / no funk noite adentro") é um baião insólito e dissonante, que tem um pé literalmente na música de vanguarda. Já a lírica "Estranha Idéia" ("de onde tiraste essa estranha idéia / de dizer que eu não te amo como outrora / que não és mais meu ombro amigo / que virou fauna onde era flora") explora bem a região mais aguda da voz de Miriam, intérprete segura e expressiva, num arranjo de coloração clássica.
Molina diz que recebeu carta branca de Itamar para musicar as letras. "Ele me deixou bem à vontade. Senti que ele queria ver essas letras com uma roupagem harmônica e melódica diferente da que ele utilizava."
Molina e Miriam esperam receber convite de alguma gravadora interessada em produzir um CD. "Se isso não acontecer nos primeiros dias do show, vamos gravá-lo ao vivo mesmo", promete o compositor.