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Crítica/erudito
Banda Sinfônica se supera e chinesa brilha com a Osesp
ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA
Messiaen (1908-92) é sempre interessante, Jean Louis Steuerman continua um dos maiores pianistas brasileiros e a Banda Sinfônica se superou tocando "Oiseaux Exotiques", na abertura da temporada, quarta-feira no Cultura Artística.
Regida pelo maestro Abel Rocha, a Banda Sinfônica nem parecia a mesma que acabara de fazer a estréia da "Abertura Sobre Ostinato", de André Mehmari (1977), com esperada competência, mas um pouco em clima de ensaio geral, ainda à procura de um sentido mais claro das coisas.
Atacando as fantasias ornitológicas do gênio católico francês, Steuerman soou como seu intérprete predestinado: ao mesmo tempo direto, aberto e cheio de nuanças, separando os planos da música em camadas. Composta em 1956, essa é uma de três peças da época que têm por base o canto dos pássaros, objeto apaixonado de estudo do compositor.
O conjunto de 17 músicos -11 sopros e metais, seis percussionistas- não tem vida mole nesse paraíso de trinados e silvos. O piccolo, em especial (Adriana Coronato), faz as vezes de uma esvoaçante alma livre, sob os céus de graça e de luz.
A partitura é difícil para todo mundo; todos tocaram com gana, cada um com cor própria, e sem esquecer do piano. O melhor da Banda, tocando coisas de um estranho amor.
Nada mais distante desse mundo do que as violências de "Ivã, o Terrível", a cantata cinematográfica de Prokofiev (1891-1953), que a Osesp tocou na noite seguinte (e repete hoje à tarde), regida pela chinesa Xian Zhang.
Originalmente feita para um filme de Eisenstein, composta em tempos de guerra (1944) sob o jugo de Josef Stálin, a música foi transformada em cantata autônoma postumamente, em 1961.
Pede um grande coro -as forças somadas do Coro da Osesp e do Coral Lírico de Minas Gerais, mais o Coro Infantil da Osesp -, narrador (Odilon Wagner), contralto (Adriana Clis) e barítono (Stephen Bronk) -fora a orquestra com tudo a que tem direito, incluindo duas harpas e três saxofones.
A Osesp vive para tocar música assim; e o repertório da primeira metade do século 20 talvez seja seu maior trunfo.
Sob a direção da diminuta, energética, seguríssima regente convidada (Xian Zhang é a atual regente associada da Filarmônica de Nova York), a orquestra faz de "Ivã, o Terrível" um ambivalente épico, que mina por dentro as atrocidades narradas.
Que o sanguinário Ivã do século 16 e o ditador Stálin se confundem aqui fica evidente, em retrospecto; mas a evidência está disfarçada de segredo, e o segredo seduz com espetacular orquestração.
Sem falar no espetacular assobio do fim, que vibra na alma como nenhum passarinho.
BANDA SINFÔNICA
Avaliação: bom
OSESP
Avaliação: ótimo
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