do enviado especial a Brasília

"Bleeder" ("Sangrador") é um pequeno grande filme. Pequeno na escala (baixo orçamento, poucas locações, poucos personagens), grande no empenho estético e no impacto dramático.
A partir de um evento central - a gravidez não-planejada de Louise, uma garota da periferia de Copenhague -, o cineasta compõe todo um mundo movediço, traiçoeiro e sangrento, habitado pelos seres desajustados que vivem nas beiradas da afluente sociedade escandinava.
As tensões se sobrepõem umas às outras: entre Louise e seu marido Louis, um fã de filmes de artes marciais; entre Louis e Leo, o irmão racista de Louise; entre Leo e os imigrantes turcos etc. etc.
O roteiro bem construído e o excelente trabalho dos atores conferem densidade humana a cada personagem, mas o que dá ao filme uma energia quase insuportável é sua engenhosa construção visual, que extrai o máximo efeito possível da tela larga, dos movimentos nervosos de câmera e da lente grande-angular.
O ambiente, em "Bleeder", é movente e ameaçador, acentuando o desequilíbrio dos personagens. Sobre um fundo vago, escuro e deliberadamente desfocado, as cores quentes - sobretudo o vermelho, usado também nos "fade-outs" entre as sequências - vibram na tela como feridas vivas.
Há uma progressão dramática implacável, que leva à agressão e à morte. Estamos longe da violência gratuita e festiva de um Tarantino ou de um Oliver Stone. Aqui, cada fotograma, cada fala de personagem, cada incidente de percurso conduz ao sangue anunciado no título.
A trilha sonora navega pelas águas da música pop (de John Lennon ao heavy metal), mas em gravações menos conhecidas, inseridas ao longo do filme sempre de modo surpreendente e eficaz.
O público brasiliense tem hoje mais uma chance para conferir "Bleeder". Os demais brasileiros devem esperar que alguma distribuidora se disponha a lançá-lo comercialmente no país. (JGC)