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LITERATURA
Obra do jornalista Pedro Alexandre Sanches diz que Caetano Veloso e o grupo tropicalista mataram o gênero
Livro realiza necropsia bonita do samba
CYNARA MENEZES
ESPECIAL PARA A FOLHA
O samba morreu em 1968. Já
agonizava, e o golpe de misericórdia quem deu foram Caetano Veloso e seus tropicalistas. Quem
defende essa teoria é o repórter e
crítico da Folha Pedro Alexandre
Sanches, 32, em seu livro "Tropicalismo - Decadência Bonita do
Samba", que chega na segunda
metade de agosto às livrarias.
Nele, fruto de uma pesquisa que
começou há mais de cinco anos, o
autor faz a exumação do cadáver e
busca a causa mortis. Disseca as
canções dos principais "algozes"
do samba -Caetano, Gil- e de
seus defensores -Paulinho da
Viola, Chico Buarque.
Caetano, não há como negar, é a
figura central dessa necropsia tardia, em análises que, apesar da
narrativa acadêmica, surpreendem pelo número de hipóteses e
críticas feitas a partir de quase tudo: é sobre música, mas aí estão
política, cinema, artes plásticas,
um painel do Brasil do período.
Morto pelos tropicalistas, o samba "não se recuperou jamais", diz
Sanches. Leia a seguir trechos da
entrevista com o crítico.
Folha - É impressão ou o livro coloca Caetano como o responsável
pela "morte" do samba?
Pedro Sanches - Ele é o catalisador principal, mas o responsável é
o tropicalismo, não os personagens que o fizeram. O modelo cultural que criaram, na figura principalmente de Caetano Veloso, foi
responsável pelo que chamo de
decadência bonita do samba.
Folha - O samba morreu jovem e
deixou um bonito cadáver?
Sanches - Não, porque não morreu jovem. Talvez já estivesse feio,
envelhecido. A metáfora que faço
é com a Aracy de Almeida, porque talvez o samba fosse aquilo:
uma senhora que foi muito importante, maravilhosa, mas que
tinha sofrido golpes. O tropicalismo foi o golpe de misericórdia.
Pela primeira vez o samba não é
transformado, é eliminado.
Folha - O samba se recuperou depois disso?
Sanches - Não se recuperou jamais. De lá para cá teve algumas
glórias, mas houve uma diluição.
O último grande nome do samba
que o Brasil transformou em glória nacional talvez seja Ivone Lara.
Mas quando aparece, em 77, 78, o
samba está morto e ela já está pegando a saudade do que já foi.
Folha - O uso da guitarra pelos
tropicalistas foi o grande instrumento dessa morte?
Sanches - Não é a guitarra, mas
um conjunto de coisas, desde as
roupas espalhafatosas, o colorido
carnavalesco, até a presença do iê-iê-iê. O que é perceptível, sobretudo em Caetano, é que não a guitarra em si, mas o rock, é fundamental para ele, mas só naquela
hora. Ele é um emepebista de primeira, então não passa a vida fazendo rock, como até podia parecer nos primeiros momentos. Foram instrumentos que eles usaram para dizer: o samba está velho, caquético.
Folha - Quem você acha que vai
reclamar mais do livro?
Sanches - Pode ser muita pretensão minha, mas acho que os irmãos Campos (Augusto e Haroldo), porque eles carregam os tropicalistas nos braços, como se fossem bebês, até hoje. Tem uma associação ali que parece inquebrável, como mãe e filho, mesmo.
Folha - Você diz que Caetano "julga reinar soberano" sobre sua comunidade na MPB. Como é isso?
Sanches - Ele parece achar. É como o leão garantindo o território
dele, é senhor de todas aquelas
leoas, daqueles leõezinhos que estão a seu redor. Nesse sentido, é
uma provocação eu ter dado o nome do capítulo dedicado a ele de
"Eu Nasci para Ser o Superbacana". É o nome da música que abre
o lado B de seu segundo disco, e
ele já estava falando isso: nasci para ser o superbacana, vocês vão
me reverenciar, me amar.
Folha - Qual é, em sua opinião, o
nome mais importante da MPB?
Sanches - Para mim, é Jorge Ben,
antes de ser Ben Jor. Ele reúne todas as qualidades que um músico
pode ter. Mas quando virou Ben
Jor virou uma coisa massificada.
Ele tem um problema que faz todo fã dele chorar de noite no travesseiro: trocou o violão pela guitarra. Dói na gente que ama os
discos do Jorge Ben saber que o
Ben Jor não toca mais violão.
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