São Paulo, quarta, 29 de julho de 1998

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Excesso de impostos impede shows estrangeiros no país

Reprodução
A banda Sonic Youth já tocou na Argentina, mas nunca veio ao Brasil



Promotores de eventos desistem de trazer artistas internacionais ao país enquanto não forem criadas leis tributárias mais flexíveis; problema é agravado pela diminuição de público a cada artista novo que vem ao Brasil


LEANDRO FORTINO
da Reportagem Local

Aproveite a nova safra de shows e festivais internacionais que começa a aportar no Brasil a partir de agosto, pois pode ser a última. É pelo menos o que diz boa parte dos promotores de shows que alegam estar perdendo cada vez mais dinheiro com o negócio.
Tributação excessiva, 50% de desconto para estudantes, porcentagens da bilheteria a serem pagas para o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), para os sindicatos dos músicos e dos técnicos e para a Ordem dos Músicos sempre foram os culpados pela insatisfação dos promotores.
Mas agora eles têm de lidar com um problema muito maior do que esses gastos já conhecidos: o público que frequenta shows vem diminuindo a cada novo artista que pisa nos palcos brasileiros.
Lloyd Cole and The Commotions, Sonic Youth, Hanson e Spice Girls foram alguns dos nomes estudados para vir ao país este ano, mas foram descartados devido ao alto risco de prejuízo que oferecem aos produtores.
Festivais como Hollywood Rock, Nescafé Blues e Ruffles Reggae e empresas promotoras como a Water Brothers deixaram de vez o mercado de shows internacionais.
"Sou um dos que insistem na burrice", diz Stephen Altit, da produtora Top Cat que, entre outros eventos, organiza um festival de blues e trouxe ao Brasil shows de David Byrne e 10.000 Maniacs.
"No Brasil, querem cobrar impostos em cima do prejuízo dos promotores. Em países como a Inglaterra, paga-se 14% de imposto do lucro líquido, descontando-se gastos com hotéis e transportes", explica Altit, ao se referir ao imposto de 17,5% que deve ser pago sobre o valor do contrato.
Altit também reclama do ISS (imposto municipal sobre o serviço), que na cidade de São Paulo é de 10% sobre o valor bruto arrecadado pela bilheteria (leia abaixo).
"Há uma bitributação. Paga-se ISS na bilheteria, mas a nota fiscal que nós emitimos para o pagamento da casa de shows também inclui ISS", afirma Altit.
A cobrança em porcentagem é outro problema para os organizadores que não conseguem fazer orçamentos fixos, pois os valores orçados variam de acordo com o que é arrecadado em bilheteria.
"Nos EUA, o Ecad pede um valor fixo. Dependendo do lugar do show esse valor varia, mas é uma quantia conhecida. Não é uma porcentagem de 10% como é feita aqui. É impossível fazer um orçamento fixo quando os gastos são tão flexíveis", explica Cali Cohen, da produtora Egg Entertainment.
Depois de perder muito dinheiro com o show de Chuck Berry, Cohen resolveu apostar em artistas menores que podem atrair um público mais segmentado, pagando um cachê pequeno, com custos de produção inferiores aos de artistas de médio e grande porte e com menores riscos de prejuízo.
É o caso da banda norte-americana Fugazi. O grupo é independente e controla todos os esquemas de publicação de letras e de pagamentos de direitos autorais.
"Quando o Fugazi toca em um outro país traz uma carta de isenção do pagamento de Ecad. Mesmo assim, recebemos um telefonema do Ecad, dizendo que o escritório da banda havia exigido o pagamento de direitos autorais."
"Se não tiver patrocínio não trago ninguém ao país", diz Célio Fernandes, da Joker Entertainment, que está organizando no país o festival Close-Up Planet.
Fernandes confirma que houve shows que foram oferecidos a sua produtora, mas acabaram dispensados por falta de patrocínio.
Em abril de 97, o advogado Marcelo Saraiva, que trabalha com organização de shows há dez anos, montou a Associação das Empresas Promotoras de Eventos Artísticos e Esportivos do Estado de São Paulo com o objetivo de batalhar leis mais justas. Segundo ele, a promoção de eventos é tratado no país como uma atividade eventual.
"A Mercury, por exemplo, tem um escritório, com sede própria, com 30 funcionários. Além de uma carga tributária de uma empresa normal, há encargos extras que, mesmo com os incentivos de leis de apoio cultural, inviabilizam um show", explica.
A solução, para o advogado, só virá quando começarem a cobrar impostos sobre o lucro líquido. "Os promotores de shows internacionais são perseguidos. Quero tentar salvar uma classe morta."



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