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MONK & COLTRANE/CRÍTICA
Músicos geniais criam bem engrenada máquina rítmica
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Primeiro, o silêncio. As palmas entram tímidas logo depois e, aos 11 segundos, o piano. A introdução é tocada somente pelo
pianista, com a delicadeza e a
complexidade que lhe são habituais. Exatamente no meio de
uma frase do piano surge o saxofone, acompanhando o raciocínio
melódico e expandindo as idéias
musicais iniciadas dois minutos e
seis segundos atrás. Os dois continuam se entremeando e se completando, solitários, até o primeiro toque da vassourinha na bateria, aos quatro minutos e meio.
Até o fim dos quase oito minutos de duração de "Monk's
Mood", o tempo parece parar para que a música possa existir. Não
é apenas um quarteto tocando
piano, saxofone, baixo e bateria,
são quatro pessoas criando mágica diante de nossos ouvidos. É o
fluxo de consciência em tempo
real de dois dos maiores gênios
musicais de que já se teve notícia.
Por quase uma hora, acompanhamos os improvisos saídos do piano de Thelonious Monk e do saxofone de John Coltrane (e do
baixo de Ahmed Abdul-Malik e
da bateria de Shadow Wilson)
-tudo o que aconteceu na noite
de 29 de novembro de 1957.
As palmas entram, sempre, no
penúltimo segundo de cada música, quando o público percebe instintivamente o embate de deuses
chegando ao fim. A segunda música do set, "Evidence", novamente começa com Monk solitário ao
piano, até Coltrane chegar, acompanhando-lhe exatamente na
mesma linha melódica. O impressionante Shadow Wilson (que
morreria dois anos depois, deixando seu nome injustamente esquecido) vem logo atrás, dessa
vez marcando presença com a bateria levada no chimbal. Por baixo, Ahmed Abdul-Malik sustenta
e acompanha ritmo, andamento,
harmonias, melodias.
Na terceira música, voltamos à
lenta complexidade das harmonias e melodias desconstruídas de
Monk em "Crepuscule with Nellie", composição que soa como
um standard subvertido, especialidade de Monk: a familiaridade,
as melodias perfeitas, tocadas
com aquele toque de subversão.
Coltrane, Wilson, Abdul-Malik
entram pouco depois dos dois minutos, no mesmo toque.
Em "Nutty", a faixa seguinte, todos funcionam juntos como uma
engrenada e empolgante máquina rítmica. Coltrane sola com
vontade, deixar fluir sua inspiração, vinda tanto do bebop como
do cool, já mostrando a genialidade completa que estava por vir.
"Epistrophy", dos maiores clássicos de Monk, com seus diferentes andamentos de bateria, é o
ponto mais alto de um clássico tão
grande, onde todos se encontram
em seu momento mais inspirado.
E isso é ainda a metade do show,
que traz só composições (inesquecíveis) de Monk, exceto pelo
único standard tocado pelo quarteto na noite, "Sweet and Lovely",
que seria regravado anos depois
por Monk em disco de piano solo.
Após quase 50 anos na estante, a
música passada de sons para fitas
para CD continua não só tão moderna e atemporal quanto no dia
em que foi gravada, mas se revela
o registro definitivo do encontro
de Thelonious Monk sendo tão
Thelonious Monk quanto poderia e John Coltrane registrando os
primeiros ápices de genialidade.
Injusto é avaliar o disco com as
mesmas quatro estrelas que todos
os outros.
(RONALDO EVANGELISTA)
Thelonious Monk Quartet with John Coltrane at Carnegie Hall
Gravadora: Blue Note/EMI
Quanto: R$ 35, em média
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