|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Escritor de 55 anos, quarto maior best seller do planeta, é o novo dono da cadeira 21 da ABL
'É revolução interior', diz acadêmico Paulo Coelho
CASSIANO ELEK MACHADO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
A espada japonesa que ganhou
no caminho de Santiago de Compostela, o músico Raul Seixas
(1945-1989) e o autor de "Meu Pé
de Laranja Lima", José Mauro de
Vasconcelos (1920-1984). É com
essa "entourage" que o escritor
Paulo Coelho pretendia entrar pela porta da frente da centenária
Academia Brasileira de Letras.
O autor de "O Alquimista" assumiria na noite de ontem uma das
40 "imortalidades" da instituição
criada por Machado de Assis,
com discurso que cita "Eu prefiro
ser essa metamorfose ambulante
do que ter aquela velha opinião
formada sobre tudo". Coelho diz
que a ABL é mais uma dessas suas
cotidianas metamorfoses. "É uma
revolução interior", opina o escritor, em conversa com a Folha.
Não é sua única revolução. Esse
vendedor de 53 milhões de livros
em mais de 150 países ("mesmo
número de votos de Lula"), que o
credenciam como o quarto maior
best seller do planeta, diz que toda
a sua literatura "mexe com o sistema estabelecido". Leia a seguir
trechos de entrevista com o dono
da cadeira número 21 da ABL.
Folha - O sr. escolheu o dia de São
Judas Tadeu, padroeiro das causas
impossíveis, para a data de sua
posse na Academia. O sr. conseguiu
o impossível?
Paulo Coelho - Tudo o que pedi
sempre foi possível. É uma maneira de homenagear um santo de
devoção. A Academia, é verdade,
é um sonho de longa data. Antes
de começar a carreira, adolescente, já pensava em um dia tomar
parte da ABL. A causa ficou mais
impossível depois que comecei a
escrever. A crítica foi muito rígida
e comecei a achar que não conseguiria. Mas como você vê, o tempo é o senhor da razão.
Folha - O sr. mencionou as críticas
duras e deve concordar que ainda
hoje enfrenta grande preconceito
como escritor best seller. Ontem
um ex-operário, que disse ter lutado a vida toda com preconceitos,
assumiu a Presidência da República. Hoje o sr. toma posse na Academia. O sr. se identifica com Lula?
Coelho - Graças a Deus a vida
muda, o país muda, os preconceitos terminam. Eu e Lula, é curioso, temos uma coisa em comum,
embora o fenômeno dele seja
mais concentrado. Ele teve 53 milhões de votos. Em junho completei 53 milhões de livros vendidos
em todo o mundo. Além de vencer os preconceitos construímos a
imagem de um Brasil novo.
Folha - O sr. vai ensinar os acadêmicos nos chazinhos das quintas
como fazer para vender milhões?
Coelho - De jeito nenhum. Primeiro por que não conheço o segredo. Segundo por que a proposta da Academia é uma discussão
séria da cultura e da língua. Estamos ali não para esse tipo de troca, mas para debates da língua e
cultura brasileira.
Folha - O sr. já recebeu prêmios
importantes fora do país usando
jeans tênis. Como vai ser a adaptação às novas formalidades?
Coelho - Sou informal até o limite do possível. Alguns rituais devem ser cumpridos. Você ser um
revolucionário não significa ficar
quebrando tradições importantes. Eu que me dedico muito ao
mundo espiritual entendo às vezes o valor da tradição.
Folha - O sr. é um revolucionário?
Coelho - Meu estilo é totalmentre revolucionário, meu trabalho
é totalmente revolucionário. Por
isso houve essa reação tão exacerbada. John Grisham, o autor mais
vendido no mundo, diz que não
recebe nem críticas negativas
nem positivas. Eu, pelo contrário,
sempre provoco reações exacerbadas, para o bem ou para o mal.
Tudo o que provoca reação é por
que mexe com um sistema estabelecido. É uma constante na vida
de todos os escritores. Todas as
vezes que mexeram no estilo mexeram com o sistema acadêmico.
Não estou falando da Academia
Brasileira de Letras, mas da "inteligentsia". Meus livros são revolucionários por sua mensagem,
uma proposta existencial, e acho
que são revolucionários no seu estilo. É um estilo minimalista, que
as pessoas confundem com superficial. Os críticos não dão crédito ao povo, são democráticos
politicamente, mas fascistas como intelectuais.
Folha - O sr. vai revolucionar a
Academia?
Coelho - Minha escolha não é
uma revolução da Academia. Mas
a Academia é uma revolução interior minha. Concorrer foi um risco. Se perdesse, o mundo todo ia
dizer Paulo Coelho perdeu. Mas
sou corajoso.
Folha - Em Frankfurt seu próximo
livro estava sendo divulgado com a
idéia de que vai explorar o sexo. Dizia um folheto que "11 Minutos",
romance que você lança no ano que
vem, começa com a frase "Era uma
vez uma prostituta chamada Maria". Por que o sexo?
Coelho - Eu acho que nós, não os
brasileiros, o mundo todo, temos
uma relação muito complicada
com sexo. Sempre sonhei em escrever sobre isso. Quando se escreve para 53 milhões de pessoas,
se escreve para si mesmo. E como
alguém de uma geração que viveu
o sexo exacerbadamente, a geração hippie, eu tinha interesse em
compreender. Você quando escreve tem de ter honestidade. O
leitor perdoa até livro mal escrito,
mas não desonesto. Polêmico ou
não é a minha verdade.
Texto Anterior: Literatura: ABL lotada saúda o imortal Coelho Próximo Texto: Trecho Índice
|