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ANÁLISE
Incoerência prejudica "Sexo Frágil"
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
Os seriados norte-americanos penetram o espaço aéreo da TV brasileira, uma TV que
até hoje se diferenciou no panorama internacional justamente por
uma estranha capacidade autóctone de produção.
As convencionais sitcoms estão
disponíveis nos canais a cabo. De
lá inspiram produções da TV
aberta, que deixam a desejar.
É o caso de "Sexo Frágil", o seriado que substituiu "Os Normais" no horário nobre da sexta-feira. O novo programa foi anunciado como uma versão masculina de "Sex and the City", a sitcom
exibida no Multishow.
O projeto de realizar uma comédia de costumes que expressasse o
ponto de vista dos homens sobre
a instabilidade das relações amorosas pós-liberação da mulher
acabou por se revelar uma versão
tupiniquim de outra sitcom, "No
Mundo dos Machos", que o mesmo canal exibe às segundas. O
pastiche não funciona.
Quatro moços embaixo de um
edredon comendo pipoca e assistindo TV de frente para a câmera
não passam de expressão literal
dos gringos "couch potatoes".
Suas tentativas fracassadas de
conquistar garotas não têm graça.
A não ser por características físicas como cor ou penteado, os personagens não se diferenciam uns
dos outros.
A opção por trabalhar exclusivamente com atores homens contribui para a baixa potência cômica do programa. Situações pensadas como hetero aparecem como
interações homo. A incoerência
dramática prejudica.
Nem tudo em "Sexo Frágil" é
importado. O novo programa
herdou de seu antecessor, que
"saiu da TV e entrou para o cinema" (como se essa passagem significasse necessariamente uma
promoção), o olhar direto para a
câmera e as brincadeiras auto-reflexivas. Vani e Rui, de "Os Normais", chamavam flashbacks.
Nossos novos candidatos a heróis
chamam os comerciais.
Mas o que era hilário no outro,
aqui é enfadonho. As opções de
produção adotadas pela equipe
de "Os Normais" são soluções para equações muito concretas, do
Rio de Janeiro de hoje.
Gravações principalmente em
estúdio, suporte digital, poucos
-mas bons- atores são ingredientes que se somam à qualidade
de texto e cuidado de pós-produção, para resultar em um produto
que repercutiu desde o primeiro
episódio.
Com temporadas mais ou menos engraçadas, "Os Normais" é
mais uma demonstração de que é
possível fazer barato, com inventividade. O mesmo não vale para
"Sexo Frágil", que ainda não disse
a que veio.
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
SEXO FRÁGIL. Quando: sexta, às 23h05,
na Globo.
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