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CRÍTICA
Desconstrução de filmes de amor sobrevive ao peso da caricatura
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Comecemos pelo fim: essas
estrelinhas aí embaixo são
um tormento para o crítico que
deseja discutir um filme em vez de
emitir um julgamento peremptório. Saber que tudo vai desembocar no veredicto estelar faz com
que o crítico organize todo o seu
discurso de modo a justificar a
sentença.
O leitor ganhará mais, portanto,
se esquecer as estrelas e tiver
consciência de que as considerações a seguir são parciais e provisórias, como todo juízo humano.
"Como Fazer um Filme de
Amor", longa de estréia de José
Roberto Torero, apresenta-se como uma comédia romântica que
desconstrói o cinema romântico.
A idéia é engenhosa, ainda que
não totalmente original (os filmes
do trio Zucker-Adams-Zucker,
do tipo "Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu", fazem o mesmo com
vários gêneros). Trata-se, aqui, de
narrar uma história de amor denunciando, a cada passo, os clichês do filme de amor.
Um narrador (Paulo José), em
"voice over", explica didaticamente ao espectador como se realiza uma fita do gênero, da definição dos personagens à escolha
dos cenários e da trilha musical.
O casal em questão é formado,
de modo característico, por uma
fotógrafa pobretona, Laura (Denise Fraga), e um rico empresário
da área de publicidade, Alan (Cassio Gabus Mendes).
Os vilões que tentam frustrar o
romance são a ardilosa Lilith
(Marisa Orth), apaixonada por
Alan, e seu servo fiel Adolf (André
Abujamra).
O primeiro problema do filme é
o descompasso entre esses dois
pares de personagens. Enquanto
o casal romântico central comporta uma certa ambigüidade,
dando ensejo a uma ironia metalingüística quase adulta, a dupla
de vilões parece saída de um filme
da Xuxa ou dos Trapalhões, de
tão chapada, unidimensional e tolamente caricata.
O que compensa o humor pastelão quase ultrajante desse "eixo
do mal" são alguns achados cômicos, como os diálogos entre o protagonista Alan e o narrador onisciente que paira sobre a ação como um deus invisível.
As passagens mais divertidas
são aquelas em que o filme parece
estar se construindo, ainda em
rascunho, e o narrador intervém
para colocá-lo nos trilhos do gênero. O amanhecer depois da primeira noite de amor, numa ilha
deserta, começa com os amantes
falando palavrões e acusando-se
mutuamente de mau hálito, antes
da devida correção de rota.
À parte isso, há o ótimo desempenho de Gabus Mendes, que parece ter compreendido à perfeição
seu papel de metagalã.
Uma bela seqüência isolada
mostra o que o filme poderia ser
se não sucumbisse, por sua vez,
aos clichês do humor fácil: a serenata que Alan faz sob a janela de
Laura, cantando "Eu Sei que Vou
te Amar" num caminhão de pamonha, com a ajuda de um coro
de vizinhos.
Nesse momento, amor rima
com humor, construindo um lirismo autenticamente urbano e
popular. Vale o ingresso.
Como Fazer um Filme de Amor
Direção: José Roberto Torero
Produção: Brasil, 2004
Com: Denise Fraga, Cassio Gabus
Mendes
Quando: a partir de hoje nos cines
Anália Franco, Cinearte, HSBC Belas
Artes, Iguatemi e circuito
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