São Paulo, sábado, 29 de outubro de 2011

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RÉPLICA

Adeus, senhor Pereira


SE A NOVA EXPRESSÃO MUSICAL NÃO É AUDÍVEL DA "TORRE DE CRISTAL", NÃO É UM PROBLEMA DA CENA, E SIM DO POUCO (OU NENHUM) ESFORÇO DO JORNALISTA. É A CEGUEIRA DE QUEM OLHA PARA O RETROVISOR E PENSA QUE ESTÁ OLHANDO PARA O FUTURO

PABLO CAPILÉ
ESPECIAL PARA A FOLHA

Na sua coluna na Ilustrada de 15/10/2011, "Adeus aos Indies", o sr. Álvaro Pereira Júnior tenta reduzir a produção musical independente a uma cena preguiçosa, pouco criativa e oportunista.
Acontece que, no século 21, a melhor parte da música brasileira é independente. A revolução digital mudou para sempre hábitos de produção, circulação e consumo.
As grandes gravadoras insistem em tratar interessados em música como meros consumidores. É por isso que estão derretendo.
Foi-se o tempo em que os "críticos" cumeavam a pirâmide perversa do sucesso, num conluio incestuoso entre a indústria da música e a da mídia.
Não é a música que está morrendo, é a pirâmide. A música vai bem, obrigado.
Se essa nova expressão musical não é audível da "torre de cristal", não é um problema da cena, e sim do pouco (ou nenhum) esforço do jornalista.
É a cegueira de quem olha para o retrovisor e pensa que está olhando para o futuro.
Roqueiro rebelde de gabinete, o sr. Pereira fabrica polêmica contra dois fenômenos reais: a cena musical paulista, que chama pejorativamente de "indie-sambinha", e o circuito Fora do Eixo, que reúne cem coletivos de 27 Estados em todo o país, que chama de "indies estatais".
De Macapá a Santa Maria (RS), de Rio Branco (AC) ao Recife, passando por Belém, Salvador, Brasília, Belo Horizonte etc. até o eixo Rio-São Paulo, os artistas se organizam tendo o público em rede como aliado.
O fim do modelão concentrador dá espaço para a diversidade estética e territorial no Brasil de verdade.
Os 2.000 participantes do Fora do Eixo, nos 5.000 shows e 180 festivais anuais que produzem, circulando 10 mil bandas, têm sim acesso, através de editais, a verbas públicas municipais, estaduais e federais.
É bom que governos tenham políticas culturais para além do escopo (mercadológico) da Lei Rouanet. Para falar de referências caras ao sr. Pereira, é assim nos EUA. E o que seria da música e da cultura inglesa sem a megaestatal BBC?
Essa foi uma conquista da gestão Gil/Juca Ferreira no Ministério da Cultura.
Atacando essa gestão e a programação do Sesc, que sempre pensaram a produção e circulação independente de uma perspectiva dinâmica e democrática, o sr. Pereira mostra de que lado está: o da desinformação.
É por isso que o convidamos a praticar a sua nobre profissão, o jornalismo: sair de trás do teclado rancoroso e de um estado de preguiça investigativa e cinismo intelectual. Ou então será "Adeus, sr. Pereira".

PABLO CAPILÉ é gestor do circuito Fora do Eixo


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