São Paulo, sábado, 29 de novembro de 2008

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Brasil em 1ª pessoa

O jornalista Jorge Caldeira reúne em livro relatos de testemunhas das principais passagens da história do Brasil e afirma que o país não valoriza a subjetividade

Rodrigo Paiva/Folha Imagem
Jorge Caldeira, que pesquisou relatos da história do país

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

"O alemão Hans Staden (c.1520-1576) teve a oportunidade de ver de perto uma cerimônia que era central em toda a cultura tupi-guarani: comer a carne de um guerreiro inimigo valente, num ritual que reunia várias aldeias."
Feita a breve explicação, que abre um dos capítulos do novo livro do jornalista e historiador Jorge Caldeira, o leitor pode em seguida receber a "notícia" da cerimônia antropofágica diretamente da pena de Staden.
Em "Brasil - A História Contada por Quem Viu", Caldeira reuniu relatos de "testemunhas da história" do país, de Pero Vaz de Caminha a Pedro Collor de Mello, em textos que descrevem, de um ponto de vista particular, os momentos capitais da experiência brasileira.
Como se pode imaginar, não era todo dia que um sujeito tinha a "oportunidade" de Staden e sobrevivia para contar história. A eficiência dos tupis era de fazer inveja a qualquer manual de auto-ajuda corporativa. Isso não faz do milagroso texto do mercenário alemão, no entanto, uma exceção na reunião feita por Caldeira.
Num país que tardou -e muito- a ter imprensa e universidade, relatos do que quer que seja eram coisa raríssima.
São poucas as vozes disponíveis para a seleção dos historiadores. Talvez isso ajude a explicar uma constatação do autor: "O ponto de vista não é muito valorizado na história do Brasil".
"É curioso isso. Pensamos o Brasil mais em termos de grandes abstrações do que na concretude, na coisa pequena, o momento, o fragmento", afirma o jornalista, que disse ter procurado ir contra a corrente e reunir tais "fragmentos" de forma sistemática.
Paradoxalmente, quando há relatos, muitos são de altíssima qualidade. Estão lá o padre Antônio Vieira a descrever o sofrimento dos escravos, Lima Barreto que saúda a abolição da escravidão, Nelson Rodrigues no momento em que aplica em Pelé o epíteto de "rei".
Assim como na reflexão "sociológica" sobre o Brasil, os escritores tiveram, também nesse caso, que acumular o trabalho da ficção e da realidade -antes que as universidades e jornais formassem outros observadores "técnicos"-, cumprindo o papel de "jornalistas" dos grandes eventos.


BRASIL - A HISTÓRIA CONTADA POR QUEM VIU
Organizador:
Jorge Caldeira
Editora: Mameluco
Quanto: R$ 59 (656 págs.)



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