São Paulo, sexta-feira, 30 de janeiro de 2004

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O LIVRO

Passado sombrio do autor não diminuiu admiração dos fãs

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Patrick O'Brian escreveu 20 romances protagonizados pela dupla Jack Aubrey, um capitão da Marinha Real britânica durante as guerras napoleônicas, e seu amigo Stephen Maturin, médico e espião. A série já vendeu mais de quatro milhões de exemplares, foi traduzida em várias línguas (inclusive em Portugal e futuramente no Brasil, pela editora Record) e gerou vários livros que explicavam detalhes da série como a terminologia e a geografia.
O filme que estréia agora é uma mistura de dois livros, "Master and Commander", o primeiro da série, de 1970, e "The Far Side of the World", o décimo.
A adaptação tem seus lados curiosos. No décimo romance, os americanos são o inimigo de Aubrey e colegas durante a guerra de 1812. Como não pegaria bem fazer um filme de Hollywood em que os americanos fossem os bandidos, o papel ficou para os franceses.
O'Brian estava escrevendo o 21º romance da saga quando morreu aos 85 anos em 2000, com pelo menos três capítulos inéditos que poderão um dia ser publicados.
Só em 98 foi revelada, pelo jornal inglês "The Daily Telegraph", a real identidade de O'Brian, que sempre fora avesso a dar entrevistas e detalhes da sua vida.
Seu nome verdadeiro era Richard Patrick Russ e ele era inglês, não irlandês, ao contrário do que o nome adotado (e algumas declarações mentirosas dele) sugeriam. Ele abandonou à pobreza sua primeira mulher e seus dois filhos. Foi morar semi-recluso na França com a segunda mulher.
O próprio Russ-O'Brian escreveu, em um volume de ensaios em sua homenagem em 1994, que "é com certa relutância que eu escrevo sobre mim, em primeiro lugar porque esse exercício é raramente bem sucedido, e mesmo que fosse, o homem com frequência não coincide com seus livros, os quais, se o platônico "não quem, mas o quê" for aceito, são os únicos objetos legítimos de curiosidade".
Apesar desse caráter pouco admirável do autor, os livros da série viraram objeto de culto. Escritores como A. S. Byatt, Iris Murdoch, Julian Symons e T. J. Binyon eram fãs devotados.
A febre Aubrey-Maturin se alastrou nos EUA depois que em 1991 o escritor Richard Snow, em resenha no "The New York Times", chamou a série de "os melhores romances históricos escritos".
A ficção náutica-histórica teve seu apogeu com o britânico C. S. Forester (1899-1965), autor da série com o capitão Horatio Hornblower (também já filmado). Vários imitadores dos dois lados do Atlântico surgiram depois, mas O'Brian foi o único que conseguiu transformar o gênero, muitas vezes visto como simples "livros de aventuras", em literatura.

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