São Paulo, segunda-feira, 30 de março de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crítica/ "Domingos"

Diretora capta realidade e ficção do mundo de Oliveira

O cineasta e dramaturgo Domingos Oliveira é tema de filme da estreante Maria Ribeiro, que passa no Rio e em SP

PEDRO BUTCHER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Não gostar dos filmes de Domingos Oliveira é perfeitamente possível; não gostar de Domingos Oliveira é bem mais difícil. Seu amor incondicional pela vida é tão genuíno e profundo que contagia os mais céticos. Isso porque não se trata daquele amor-clichê, irritante -e sim de um sentimento inteligente, traduzido em pensamentos e emoções.
É esse Domingos Oliveira que a diretora Maria Ribeiro capta muito bem em seu documentário de estreia, escolhido para inaugurar a porção carioca do festival É Tudo Verdade, na última quinta-feira. Uma escolha, aliás, para lá de acertada, pois Domingos é, antes de tudo, representante legítimo de uma certa boemia carioca em extinção.
"Quando me casei, ganhei dois apartamentos do meu pai. Bebi os dois apartamentos", ele conta no filme. "Era a boemia mais feroz. Bebia dois dias e dormia um."
Maria Ribeiro pode ser uma cineasta inexperiente, mas soube tirar bom proveito da proximidade que tem de Domingos (com quem trabalhou várias vezes como atriz) para acompanhá-lo de perto sem ser invasiva.

Material de arquivo
Por outro lado, convocou a experiente Jordana Berg (dos filmes do documentarista Eduardo Coutinho) para montar sua obra. E a montagem, aqui, faz toda a diferença. Logo no começo, por exemplo, uma imagem recente de Paulo José jogando sinuca é seguida de uma imagem do ator fazendo esse mesmo gesto em "Todas as Mulheres do Mundo" (1967).
Assim será durante boa parte do filme: conexões que viajam no tempo e estabelecem relação entre presente e passado, entre "realidade" e ficção. São essas, enfim, as duas questões do filme: a passagem do tempo e a velhice que chega (para a inconformidade total de Domingos) e a absoluta indistinção entre vida e arte, que é a marca pessoal do trabalho do cineasta, dramaturgo, ator e diretor.
O uso do material de arquivo, portanto, é brilhante. O filme não aproveita apenas cenas de seus filmes mais conhecidos (além de "Todas as Mulheres...", há também "A Culpa", "Amores", "Separações" e o mais recente, "Juventude", entre outros), mas também de peças de teatro, espetáculos (como o "Cabaré Filosófico"), programas de TV e até um curso que ele deu no Casa Grande, um teatro histórico do Rio de Janeiro.

Mulheres
Às imagens da ficção se contrapõem cenas das duas festas que comemoraram seus 70 anos (em 2006) e entrevistas realizadas em momentos diferentes. Nessas entrevistas, um assunto se impõe com força: as mulheres. Domingos fala dos cinco casamentos que teve, principalmente da paixão por Leila Diniz -cujo fim do relacionamento inspirou "Todas as Mulheres do Mundo"- e por Priscilla Rozembaum, com quem está há 25 anos.
No fim, a conclusão mais importante: "Eu sou aquilo que as mulheres que amei fizeram de mim".


DOMINGOS
Direção: Maria Ribeiro
Quando: em SP, no Cinesesc, hoje, às 19h, quarta, às 17h, e domingo, às 15h. No Rio, no CCBB, amanhã, às 16h30. Em Brasília, no CCBB, dia 21, às 18h30, e dia 26, às 20h30
Classificação: não indicado a menores de 14 anos
Avaliação: bom



Texto Anterior: Memórias de chumbo
Próximo Texto: Irregular, Curitiba tem organização falha
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.