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DISCO - LANÇAMENTOS
Zoli chega ao "romântico sem dor-de-cotovelo"
PAULO VIEIRA
especial para a Folha
O guitarrista carioca Claudio Zoli, 38, poderia cerrar fileiras com os
artistas malditos -caso de Jorge
Mautner, Jards Macalé, Itamar Assumpção- se houvesse alguma
afinidade poética entre eles. A afinidade que há, esta sim, é a quase
impossibilidade de vender discos,
além da dificuldade em gravá-los:
foram quatro em 12 anos.
Desde sua aparição (comercial)
com o grupo Brylho -e o estouro
de "Noite do Prazer", aquela do
verso "trocando de biquíni sem
parar", digo, "tocando B.B. King
sem parar"-, ele fez três discos
por grandes gravadoras sem nenhuma repercussão. Chega agora a
"Férias", o quarto, da Trama.
Mais do que nunca, Zoli se
apoiou no trabalho dos produtores
(Bôscoli e Max de Castro), que encheram o disco de rimas de rap,
loops e timbres.
Grande guitarrista, Zoli está ficando sozinho no panteão do soul
brasileiro. Tim Maia já era, Cassiano -com quem iniciou a carreira- e Hyldon estão em exílio voluntário. Isso o fez "pensar de que
maneira continuar compondo."
Chegou ao formato "romântico
sem dor-de-cotovelo" com a ajuda
de Bernardo Vilhena, presente em
nove das dez faixas do CD.
Zoli acha que consegue se mostrar por inteiro em "Férias"
-"guitarrista, cantor e compositor"-, mas reconhece as evidentes influências do alheio que jogou
no disco -George Benson no vocalizar, acompanhando as notas da
guitarra, e Maxwell no uso de atmosferas pornô-soft.
"Decidi assumir o Benson, que
usava desde o Brylho, mas é uma
pegada diferente, sou mais blues".
Mas "Férias" não é só influências. Os versos de rap e a presença
de um DJ "atualizaram" Zoli.
O artista vê ligações do soul com
a bossa nova, e acredita ter jogado
"elementos brazucas" em seu trabalho. "Comecei ouvindo Tim
Maia e Cassiano para depois chegar em João Gilberto. Digo que
Tim fazia uma bossa nova soul,
suas melodias têm acordes parecidos com as da bossa nova. E o meu
forte também é a melodia, a canção. Numa das novas músicas, "Vida, Viração", uso muito pandeiro.
Não chega a ser um samba, mas a
música pode facilmente se tornar
um samba no show. É preciso tomar cuidado quando a gente ouve
muita música black americana,
sem querer copiamos."
Esforçando-se em não parecer
imodesto, Zoli se diz à frente de seu
tempo. "Sempre acontecia isso
com meus discos. Os executivos
das gravadoras achavam meu trabalho muito americanizado, não
me contratavam. Acho que fazia
um pop moderno demais, que ninguém entendia. Na época do
Brylho, ninguém falava em reggae,
e "Noite do Prazer" é meio reggae."
Curiosamente, quando conheceu o sucesso, com o Brylho, Zoli
não segurou, e a banda não cravou
um segundo disco. "Perdemos a
direção, e rolou uma divergência
entre nós."
A garrafa volta a girar, e Zoli reclama de seu ostracismo não-voluntário. "Vivo num país de inversão de valores. Vejo músicos na TV
que não sabem tocar uma nota no
violão e ainda cantam desafinado.
O público não sabe disso, a mídia
estoura o que ela quer, e o público
se identifica com o que ouve."
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