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Alfaiate troca agulha pelo samba
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local
Aconteceu com Cartola em meados dos anos 60 e se repete agora: o
histórico sambista carioca Walter
Alfaiate só em 1999, aos 68 anos
-"meia ponto oito", em seu dizer,
"para ficar mais suave"-, lança
seu CD de estréia. Chama-se "Olha
Aí" e sai pelo selo independente
Alma, de Marco Aurélio Braga Néri e do também compositor Aldir
Blanc.
O nome artístico do cantor e
compositor nascido em Botafogo
denuncia um traço curioso de sua
trajetória: não podendo viver de
samba, Walter fez da alfaiataria
sua fonte de renda, que mantém
até hoje.
"Sempre fui sambista, desde os
14 anos. Sempre saí nos blocos, fui
dono de bloco em Botafogo. Fiz a
primeira letra aos 14 anos, mas era
"boi com abóbora", simples, sem
pretensão. E sempre fui alfaiate
também, desde menino", ele conta, levando adiante a dupla personalidade.
Não demonstra ressentimento
pela demora em consumar a segunda profissão em disco. "Toda
profissão é assim. Não conseguir
chegar lá se deve ao Deus maior. Se
todo mundo que tem valor conseguisse, teria muita gente na parada."
O que pensa, então, da "estréia"
tardia? "É o destino mesmo. Tinha
que ser agora, ou poderia nem ter
acontecido. Vi jogadores batendo
muito mais bola que Pelé, e nunca
chegaram lá. E, também, hoje está
mais fácil gravar. Até a Tiazinha
está gravando..."
Carreira
Compositor bissexto, emergiu de
linhas e agulhas por causa do interesse de outros sambistas do Rio,
como Elza Soares -segundo ele, a
primeira a gravar uma canção sua,
"Sorri de Mim"-, Paulinho da
Viola (seu maior divulgador), João
Nogueira e Cristina Buarque.
Como numa homenagem retroativa, Walter reúne, num medley
em "Olha Aí", sambas de sua autoria que Paulinho gravou, "Cuidado, Teu Orgulho Ainda Te Mata"
(em 71), "Coração Oprimido" (79)
e "A.M.O.R. Amor" (83).
"Ele é um dos culpados pelo meu
entrosamento no samba. Nasceu
em Botafogo, me conhece, me via
atuando nos blocos. Sempre deu
declarações me elogiando, gravou
os sambas", agradece.
Na carreira de intérprete, foicrooner em gafieiras e formou vários conjuntos de samba ao longo
dos anos.
Cantando num disco inteiro pela
primeira vez, Walter deixa claras
suas influências: "Meu samba é o
sincopado, tipo o de Ciro Monteiro, Roberto Silva, Geraldo Pereira.
Como cantor, é Ciro Monteiro
quem me inspira".
Especialista em elegância nos
ternos que faz, responde se a elegância acabou no samba, em suas
novas gerações: "Não, não acabou.
Ainda há bom gosto. Claro que alguns exageram...".
Da alfaiataria, não se aposentou
até agora. "Continuo com meu ateliê em Copacabana, todo dia, das
9h às 19h." Sábados e domingos?
"Negativo, que é isso?"
"Hoje em dia tenho pouquíssimo
público", continua. "É uma profissão em extinção. Tem mês que não
faço nenhuma peça, só conserto
para sobreviver. Eu gostaria de parar, não tenha dúvida. Estou saturado, embora goste muito."
Por isso festeja a chegada ao disco: "Atualmente, há quatro meses
só vivo de música. Fiz o disco, cantei na Lapa no Carnaval. Música
não é tão cansativo. Espero que o
disco venda bem e que eu faça um
segundo. Deus querendo, não tem
dúvida".
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