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Mundo vai mal e humoristas são "raça em extinção", afirma Quino
Em tom desiludido, criador de Mafalda diz que quer voltar a desenhar, mas não sabe quando
Para autor, humoristas tendem a se repetir enquanto tratarem da sociedade, que pouco mudou com o tempo
Fotos Divulgação
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Última tira da personagem Mafalda, de 1973
DE SÃO PAULO
Leia a seguir os principais
trechos da entrevista.
Folha - Quando fazia a Mafalda, tinha esperança de que o
mundo ficasse melhor?
Quino - Sim, ela lutava para que o mundo melhorasse.
Mas, lendo alguns de seus
cartuns, parece que o mundo
está pior...
Acho que sim. Crise econômica, bancos, desemprego...
Está muito pior. Bem, mas lemos no Velho Testamento
que a humanidade sempre
esteve mal. Repare que de
Adão e Eva saiu um filho assassino. Logo, de quatro pessoas que existiam no mundo,
um quarto eram delinquentes. Então, não mudou nada.
Somos assim.
Por que parou de desenhar?
Porque parecia que estava dizendo desde sempre que o mundo ia mal. E que tinha que parar
para pensar e ver se achava argumentos diferentes.
Tem planos de voltar?
Quero voltar, mas não há
planos. Porque depois muda
sua situação, seu estado de
ânimos, sua saúde, as coisas
mudam muito.
E como está sua saúde.
Anda mais ou menos.
O que está de mais e o que está de menos?
Bem, demais estão os
anos... De menos, a
juventude.
Picasso costumava dizer que
era preciso muito tempo para
tornar-se jovem...
Isso era o incrível desse velho. Cada dia inventava uma
coisa diferente. Mas quantos
Picassos há no mundo? Pouquíssimos.
Como foi a entrada do computador em sua vida profissional?
Não entrou nunca.
Você se sente de alguma forma excluído pelas novas tecnologias?
Sim. Porque, por exemplo,
na Europa é muito comum
que você vá ao correio e não
haja uma pessoa para atendê-lo. Você vai a uma máquina, pesa a carta, vê quanto
tem que pagar e tudo o mais,
sem encontrar uma pessoa
para lhe dizer que gostou do
seu penteado hoje.
Acompanha os humoristas de
hoje em dia?
Somos uma raça em extinção. Nós, humoristas, éramos as pessoas que denunciavam situações que nem
todo mundo se dava conta.
Agora, o que se vai denunciar? Há vários livros denunciando de tudo na política e
nada acontece. Antigamente, você desenhava algo e ia
preso. Agora, nada importa.
Como cidadão de Mendoza,
gosta de um vinho?
Gosto muito. Apesar de
um senhor que se chama Michel Roland [consultor de vinícolas francês], que impõe
um tipo de vinho que tem o
mesmo gosto em todo lugar.
Mafalda não suportava sopa.
E você?
Eu gosto. Isso era uma alegoria dos governos militares:
algo de que ela não gostava,
mas que tinha que suportar.
Há trabalhos seus feitos há
muito tempo que ainda estão
atuais. Isso é sinal da genialidade do Quino ou da dos nossos políticos?
A realidade muda pouco,
os temas são recorrentes. Você lê Hamlet e tudo o que se
passava naquele castelo é o
que se passa na Casa Branca
ou em qualquer palácio de
governo. Intrigas, assassinatos. Não muda nada.
Os humoristas estão fadados
a se repetir?
Enquanto nos ocuparmos
sobre como funciona a sociedade, sim, porque ela se repete. O ser humano segue tão
mal como sempre.
Folha.com
Leia a íntegra da
entrevista com Quino
folha.com.br/il741360
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