São Paulo, quinta-feira, 30 de julho de 2009

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Ala "cultural" perde espaço na rede pública

Afastamento dos diretores ligados ao MinC é resultado do cabo de guerra político que está na origem da TV Brasil

Financiamento da emissora está totalmente ligado à Secom, comandada pelo ministro Franklin Martins; conselho é indicado por Lula

DA REPORTAGEM LOCAL

Maio de 2007. Cenário: hotel Nacional, em Brasília. Nessa ocasião, os ministros Gilberto Gil (Cultura) Fernando Hadad, (Educação), e Franklin Martins (Secretaria de Comunicação), serviram de esteio à decisão presidencial de criar a TV Brasil. Foi sob os aplausos de entidades ligadas à democratização dos meios de comunicação que, ali, durante o Fórum das TVs Públicas, assinou-se a Carta de Brasília, definidora do prumo da rede pública.
Corta. Julho de 2009. Sede da EBC (Empresa Brasil de Comunicação), também em Brasília. Dos três ministérios, restou, de fato, um. Dos primeiros líderes do fórum, não sobrou ninguém. Das determinações assinaladas no documento, poucas encontraram lugar na EBC real.
"A carta de Brasília apontava para a criação de um sistema público", diz Bia Barbosa, do coletivo Intervozes, uma espécie de ONG que fiscaliza o projeto. "A EBC, hoje, é apenas uma emissora, não uma rede. Ela chega a quem tem TV por assinatura, mas o alcance pela TV aberta é mínimo."
Os dados de audiência não são divulgados pela emissora. O argumento é que muitos dos espectadores têm acesso aos programas por parabólica. Sabe-se, porém, que os índices de audiência estão na zona do "traço". De um lado, é natural que uma emissora voltada a conteúdos diferenciados não tenha espectadores à farta. De outro, a falta de acesso à TV Brasil reflete problemas de base que não foram resolvidos.
"Há um problema de capacitação de gestores, de falta de mão de obra especializada para operação de uma TV que adote novos paradigmas tecnológicos e novos modelos de negócio. E há, ainda, problemas de infraestrutura", diz o ex-diretor Mário Borgneth.

Arranjo desfeito
Para compreender a referência de Borgneth aos "gestores" é preciso voltar às origens da EBC. A TV pública veio à tona em 2002, quando o jornalista Eugênio Bucci assumiu a Radiobras. Um ano depois, o MinC tomou para si o tema e deu a largada ao processo que culminaria no fórum de 2007.
O assunto, que de início não ecoava pelos corredores do Palácio da Alvorada, tomou corpo após a reeleição. Muitos tentaram tomar as rédeas do processo, mas Lula passou o bastão ao ministro Franklin Martins.
Com o MinC, ficaram três diretorias ligadas à programação e à constituição da rede. A presidência da empresa foi entregue à jornalista Tereza Cruvinel. Mas o arranjo se desfez. Os diretores ligados ao MinC saíram -não sem algum alarde. Leopoldo Nunes, ao deixar o posto, acusou Cruvinel de "rasgar R$ 100 milhões". Ele se referia aos recursos que o MinC disponibilizaria para a TV e que não chegaram a ser usados.
"O perfil estatal dificulta muito o trabalho da produção, cria entraves ao dia a dia", diz Orlando Senna, ex-diretor geral, referindo às exigências burocráticas que acabam por travar a engrenagem.
Borgneth, por sua vez, diz que "houve uma clara obstrução na implantação dos novos modelos de produção preconizados pelo projeto inicial e um processo de concentração de poder na presidência". Não se cumpriram, por exemplo, as promessas de incorporação da produção independente e de conteúdos vindos da sociedade.
Outra crítica diz respeito ao conselho, indicado por Lula. "Tinha que ser escolhido pela sociedade", diz Jorge da Cunha da Lima, teórico de TVs públicas. "Só assim se garantiria o caráter público da empresa."


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