São Paulo, quarta-feira, 30 de agosto de 2000


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DISCO/CRÍTICA
Álbum de estréia flagra o artista antes da "roda viva"

DA REPORTAGEM LOCAL

Não, não há nenhum segredo escondido dentro de "Tom Zé". Ele é, simplesmente (e isso não é pouco), uma coleção de 12 canções tropicalistas que quase ninguém conhece, porque haviam sido apagadas pelo tempo.
Ali, Tom Zé parecia tropicalista atípico, mais nacionalista que internacionalista. Ostentava tradicionalismo e candura num grau a mais que seus pares. Isso transparece no coro à antiga que abre "São São Paulo Meu Amor", no iê-iê-iê orquestrado "Não Buzine Que Eu Estou Paquerando", na provocação tímida ao samba em "Quero Sambar Meu Bem", na moda caipira "Sabor de Burrice".
Mas havia algo de extraordinário no ar. Matuto migrado à capital regional e depois à nacional, fez de si astuto cronista urbano, fundando entre sertão e cidade seus primeiros conflitos artísticos. Em parte, aparecia tradicional, interiorano (é o caso da delícia "Namorinho de Portão", que Gal gravou no ano seguinte) e engajado como Geraldo Vandré (letras políticas não faltavam: "Sabor de Burrice", "Profissão Ladrão", "Sem Entrada e sem Mais Nada", "Camelô"...).
Por outro lado, flertava com as luzes de néon criticadas na capa colorida e nas canções, brincava de ídolo iê-iê-iê, vencia festival, ajudava a configurar a canção urbana tropicalista, justamente ele que havia chegado de Irará, na Bahia. Era amor e era ódio.
Vista hoje, a metáfora lembra a que Chico Buarque criou para sua peça "Roda Viva", encenada em 68 pelo Teatro Oficina. O protagonista era um artista que, na perseguição ao sucesso de cada moda, primeiro simulava a politização de um Vandré, depois a alienação de um Roberto Carlos. Tropicalista, caía em danação no desenlace, tragado pelo "sistema".
Tom Zé foi, provavelmente, o protagonista real de "Roda Viva". À diferença do Ben Silver da peça, entretanto, possuía inerentes, e não por marketing, as características de Vandré e as de Roberto, as de Chico e as de Caetano e Gil.
A história, até dado momento, não aceitou absorvê-lo (referência demais para o mercado?), o que já parece também superado. Tanto é que estão de volta à circulação (dona Sony, quem diria...) outras canções tropicalistas, mais descompassadas, mas tão presentes quanto as de Caetano, Gil, Torquato, Rita e Arnaldo, Capinan.
(Ah, como sempre, nem tudo é perfeito: incluíram letras e textos, mas adulteraram a capa original, dando-lhe um close destruidor da idéia inicial. Haja.) (PAS)


Tom Zé      Lançamento: Sony Quanto: R$ 20, em média



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