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Nova versão do livro rebatiza personagens
FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ninguém mais se assombra. Sai um filme feito a partir de um texto
literário e logo uma legião de pessoas faz coro: "O livro é melhor".
Opiniões à parte, elencar diferenças é inevitável. A maior delas
está no foco narrativo. Enquanto no livro o narrador é externo à
ação, no filme as histórias que compõem "a" história da favela
são contadas por Busca-Pé.
Ganha o filme em homogeneidade -no livro, como o filme dividido em "histórias", é mais complicado seguir as trajetórias dos mais de cem personagens,
que ganham maior ou menor peso protagônico, a cada subtrama
do mosaico de Lins.
No caso de "Cidade de Deus",
porém, as comparações vão além
do filme-livro e se estendem ao livro-livro: Paulo Lins reviu as 550
páginas de seu texto original, de
1997, para uma edição que acaba
de chegar às livrarias.
Nas cerca de 400 que agora voltam ao público, porém, as mudanças maiores não vêm da influência da tela do cinema. "Na
verdade, a questão da mudança
partiu dos tradutores estrangeiros", diz Lins, 44.
"Na França, Inglaterra, EUA,
Dinamarca, Noruega, Suécia",
enumera Lins, "tiveram dificuldade para traduzir o livro". O motivo, diz o escritor, era a especificidade da linguagem. Com as alterações, ele espera ter tornado a
"linguagem coloquial um pouco
mais acessível".
A nova extensão, admite, também é resultado de uma dificuldade em colocar livro tão longo no
mercado internacional.
Além disso, praticamente todos
os personagens foram rebatizados na nova versão do romance.
Se a identificação com os personagens do filme já era um pequeno quebra-cabeças -são várias
as fusões que resultaram nas figuras da tela-, somando-se os novos nomes, o reconhecimento
torna-se mais nebuloso.
Seria uma forma de proteger o
livro do ataque comparativo? Lins
nega, mas tampouco explica muito. "Como ia sair o filme, e eu ia
mexer mesmo para o estrangeiro,
mexi para o Brasil também."
O autor acredita que a estrutura
do livro, no entanto, não mudou
substancialmente: "Ele só ficou
mais ágil. Mais direto".
Ainda que ache que certas sutilezas do ritmo narrativo do livro,
indicando a passagem do tempo,
fiquem limitadas a marcas visuais
no filme, Lins se diz contente com
o resultado, "por causa da visão
interna, que tanto livro como filme compreendem".
Se tal visão interna está no livro
(e, por consequência, no filme) é
porque Lins viveu três décadas na
comunidade. Isso, porém, não
impede que a crítica venha da
mesma comunidade. Em entrevista à Folha publicada na quarta
passada, o rapper MV Bill disse
que o filme "não traz nenhum benefício à Cidade de Deus".
Lins rebate a declaração do amigo, lembrando que seu trabalho e
o de Bill, são expressões da mesma fonte: "É a mesma linguagem,
o mesmo tudo. Se o livro não ajudar em nada, o trabalho dele também vai por água abaixo".
CIDADE DE DEUS - Escrito em 1997. De: Paulo Lins. Editora: Companhia das
Letras (tel. 0/xx/11/ 3167-0801; www.companhiadasletras.com.br).
Segunda edição, revista pelo autor. 406 págs. R$ 34.
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