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"O PISTOLEIRO" E "A ESCOLHA DOS TRÊS"
Dois primeiros títulos da série "Torre Negra" chegam hoje às livrarias
King parte da fantasia para traçar jornada
RODOLFO LUCENA
EDITOR DE INFORMÁTICA
A travessia é o mais importante. No final do arco-íris,
há um pote de ouro, o Santo
Graal, a Conhecimento, a Vida
Eterna. Mas é preciso chegar lá,
superar as intempéries, enfrentar
inimigos, vencer os próprios demônios. A história da humanidade está cravejada dessas jornadas.
O mestre do horror e do suspense também foi beber no caldeirão de Dante, Homero e Tolkien -especialmente este último- para criar seu épico de proporções mastodônticas. É "A Torre Negra", um conjunto de sete livros escritos por Stephen King ao
longo de mais de 30 anos, que finalmente começa a chegar ao leitor brasileiro. Hoje, estarão nas
prateleiras os dois primeiros livros da série, "O Pistoleiro" e A
Escolha dos Três".
O Quixote de King é um pistoleiro, Roland, que está em busca
da tal torre, que nem ele parece
saber direito o que é. Trata-se do
eixo, ponto de equilíbrio e de sustentação dos mundos, e que estaria ameaçado de ficar sob o jugo
do mal. Enfim, o leitor não precisa
se preocupar muito com ela, o importante mesmo são as aventuras.
Porque a série pode ter toda
uma justificativa filosófico-literária, ser referenciada em gigantes
da prosa e da poesia, mas quem
narra é Stephen King, e a mortandade se conta às mancheias. Num
ponto, por exemplo, Roland detona uma cidade inteira, mata a tiros um por um e sai a passo, tranqüilo como água de poço.
As metáforas e comparações,
uma das marcas registradas de
King, estão por toda a parte. Por
exemplo, uma mulher canta e se
cala, "deixando as fraturas da última nota sangrando alto no ar".
Outras características dos textos
de King, como a excessiva recorrência ao itálico -para indicar
lembranças ou conversas interiores- e às maiúsculas, também
dizem presente.
Apesar disso, a série "A Torre
Negra" pode causar um certo estranhamento no Leitor Fiel (com
maiúsculas, como o autor gosta
de se referir ao seu público). Seus
melhores trabalhos, como "Cemitério de Animais" e "O Iluminado", partem de medos que todos
temos ou podemos vir a ter e os
exagera, perverte, transforma em
monstruosidades. Aqui, a base
parece ser nada, é pura fantasia, a
lógica foge, e o leitor mergulha
num labirinto de espaço e tempo,
memórias e histórias paralelas.
"Percebi que o que eu queria escrever era uma história com o
senso de busca e a magia de Tolkien, mas ambientada no quase
absurdamente majestoso cenário
de faroeste de Leone (Sergio Leone, diretor de "Três Homens em
Conflito", uma das inspirações para "A Torre Negra')", diz King na
introdução a "O Pistoleiro".
Isso foi lá em 1970, quando King
tinha 22 anos e escreveu as primeiras linhas de seu romance
monumental, que soma cerca de
4.000 páginas. Só 12 anos mais
tarde, com o autor já muito famoso -tinham sido publicados, por
exemplo, "Carrie" e "O Iluminado"-, o primeiro volume veio a
público, iniciando a história da
série, que hoje tem fãs espalhados
pelo mundo todo.
E "O Pistoleiro" bem que precisava da fama de seu autor. Revisando o trabalho, King admite
que o texto "tinha todos os problemas do livro de um homem
muito jovem, continha uma grande quantidade de lapsos e falsos
pontos de partida".
Ele é modesto na sua autocrítica. O ponto de partida de "A Torre Negra" é chato de dar dó. Apesar da enorme quantidade de
mortos pelo caminho, que parecem indicar alguma ação, a história transcorre em tom monocórdio, contada aqui a partir do
"tempo presente" do personagem, ali em seguida em "flashback". Depois volta ao presente e,
na seqüência, um passeio por outro "quando".
A função do livro é lançar as bases que justifiquem a jornada, e isso vai sendo feito no estilo de
King, referenciando-se na cultura
pop, na literatura, na memória da
humanidade. Mas ficar parafraseando o Gênesis, do Antigo Testamento, é abusar das referências.
De qualquer forma, cumpre seu
objetivo ainda que aos soluços.
Não consegue, talvez, prender, cativar o leitor acostumado ao jeito
King de contar histórias, mas lança as bases para a segunda etapa.
Esta, sim, vale a pena. "A Escolha dos Três" poderia ser o verdadeiro início da jornada de Roland
Deschain de Gilead. É tão bacana
quanto "Os 12 Condenados",
"Onze Homens e um Segredo" ou
"Cowboys do Espaço", histórias
em que a seleção da equipe rivaliza em importância com a própria
missão a qual serão chamados.
Apesar de continuar na fantasia,
agora a história tem um ritmo,
que prende o leitor, Johnny Cash
e Beatles, lutas contra o racismo e
psicologia de botequim.
Enfim, há ação, a jornada avança. E aí dá para entender por que
"A Torre Negra" tem legiões de
leitores fanáticos e inspira sites,
que se preocupam em criar linhas
de tempo e identificar personagens e contradições da série.
Quem preferir pode comprar e
ir direto para o segundo volume
-cada um da série, por sinal, é
uma história que pode ser lida separadamente. Antes do início, um
texto de duas páginas resume o
argumento e apresenta os personagens principais e suas missões.
Mas, apesar da qualidade inferior de "O Prisioneiro", o primeiro volume tem valor especial por
causa da introdução e do prefácio,
em que King lança luzes sobre seu
trabalho com um estilo agradável,
de conversa com o leitor.
Mais, de satisfação por ter, enfim, cumprido uma tarefa de uma
vida toda. É que, exatamente
quando chegam ao Brasil os primeiros volumes da série, nos Estados Unidos aportaram os dois
últimos. Neste ano, saíram o sexto
e o sétimo volumes, e King deu
por encerrado seu épico.
O Pistoleiro
Autor: Stephen King
Editora: Objetiva
Quanto: R$ 31,90 (224 págs.)
A Escolha dos Três
Autor: Stephen King
Editora: Objetiva
Quanto: R$ 49,90 (416 págs.)
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