São Paulo, sábado, 30 de novembro de 2002

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Mostra "Paisagem Zero", que tem início hoje em São Paulo, tenta retratar o Nordeste sem cair em estereótipos

Arte e vida nordestina

FABIO CYPRIANO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Como é possível retratar o Nordeste brasileiro sem realçar preconceitos e apresentar estereótipos? A pergunta surgiu após a realização da mostra "Nordestes", organizada há três anos pelo Sesc, que foi bastante questionada na época, justamente por não fugir do lugar-comum.
Há um ano e meio, o Sesc encarregou um grupo, coordenado pelo produtor cultural Ricardo Muniz e a superintendente cultural da Fundação Joaquim Nabuco de Recife, Silvana Meireles, de enfrentar o desafio.
Trancafiados em longos seminários, seja em São Paulo ou no Recife, o grupo não chegava a um consenso. O "eureca" surgiu quando saíram dos gabinetes e visitaram a mãe-de-santo Marivalda, do Maracatu Estrela Brilhante de Pernambuco. Muniz diz que "ela contava as histórias de forma tão envolvente e mostrava como sua própria vida está totalmente ligada ao maracatu, que percebemos que a relação entre arte e vida não está separada dos processos de criação nordestinos, e era esse tipo de problematização que deveríamos tratar".
Surgiu ali o embrião do projeto "Paisagem Zero - Nordeste É Todo Lugar", que acontece hoje e amanhã no Sesc Pompéia, em São Paulo. Tomando por base o binômio arte e vida, os curadores pesquisaram artistas e pensadores que trataram do tema e chegaram a dois "padrinhos" para o projeto: o artista plástico Hélio Oiticica (1937-1980) e a arquiteta Lina Bo Bardi (1914-1992).
"Chegamos ao Hélio e à Lina porque em ambos a idéia da participação é fundamental. No primeiro, com seus penetráveis e parangolés, e na Lina porque ela sempre deixava que os operários montadores de suas mostras também tivessem espaço para criação", afirma Muniz.
Tendo por base tal paradigma, a curadoria evitou tratar o Nordeste como território, por isso "Paisagem Zero".
O evento de hoje e amanhã tem como subtítulo "Experiência 1 -°SAO", pois ocorre em São Paulo. Outras duas versões estão sendo organizadas no próximo ano e devem ocorrer primeiro no Nordeste -com o perdão da palavra-, já que problematizar a idéia de Nordeste é outra proposta dos curadores. "O Nordeste é uma criação do Sul do país. Por vários séculos, era a região que se relacionava com o mundo, e, depois que o centro foi deslocado, restaram apenas imagens do folclore e das praias", diz Meireles.
Entre as iniciativas contra os estereótipos, os curadores montaram um boteco na mostra, onde estarão à venda apenas produtos industrializados nordestinos. "Há dezenas de tipos de água engarrafa, por exemplo, que questionam a idéia corrente da permanente seca no Nordeste", afirma Muniz.


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