São Paulo, sábado, 30 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LIVRO/LANÇAMENTO

Filósofo francês discute em seu "Pequeno Manual de Inestética" as relações entre arte e filosofia

Alain Badiou prega a força da poesia

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

Em uma descrição breve, trata-se de um ensaio sobre a arte e as maneiras encontradas pela filosofia para pensá-la, muitas vezes a condenando e impondo a ela, pela força, rígidos limites. Assim é o "Pequeno Manual de Inestética", do filósofo francês Alain Badiou, lançado agora no Brasil pela editora Estação Liberdade.
"É evidente que nessa difícil relação houve sempre uma questão ligada ao poder", diz Badiou. "Isso desde o início, com a condenação dos poetas por Platão. Um sinal do poder do conhecimento, da filosofia, sobre a arte. Mas houve também um contra-ataque, com o romantismo. E esse combate acontece ainda hoje."
Alain Badiou -chefe do departamento de filosofia da École Normale Supérieure e uma das mais importantes vozes no debate intelectual em seu país- esteve nesta semana no Rio de Janeiro, para o encerramento do colóquio "Resistências". Em entrevista à Folha, ele falou sobre seu livro e, sobretudo, o poder da poesia.
"Eu uso em meu livro o poeta francês Mallarmé como exemplo de um período no qual artistas e filósofos estavam de acordo em dizer que talvez a poesia fosse o verdadeiro conhecimento; é quando a poesia assume obrigações da filosofia, como a procura pela verdade e a tomada de posição sobre o estado, as coisas do mundo", diz Badiou.
O poeta Stéphane Mallarmé (1842-1898) é usado por Badiou como um guia no "Pequeno Manual de Inestética". A figura predominante com quem dialoga, em seu texto, sobre a ambição e o papel da arte.
"Talvez pudéssemos encontrar outros exemplos em diferentes campos; no teatro, no cinema, na dança ou na pintura", continua ele. "Mas as artes visuais, as artes do corpo, não podem ter exatamente a mesma pretensão que as que passam pela escrita, em razão da linguagem. A poesia e a filosofia concordam ao menos em um ponto: desejam que a linguagem se pronuncie sobre aquilo que não é jamais dito."
E, visando ainda a força do poema, ele chega até o português Fernando Pessoa, alguém que, para Badiou, está em uma posição de superioridade em relação a todos os filósofos do século 20 -isso em consequência da "fantástica intuição intelectual" do poeta.
Alain Badiou acredita existir em Pessoa "a idéia de só ser possível pensar por meio de múltiplas vozes, e que o contrário disso seria, em resumo, insuficiente. A criação dos heterônimos foi utilizada por ele de maneira genial e profunda, e essa idéia não foi jamais retomada pela filosofia, que ignorou a poesia de Pessoa. Algo lamentável".
Chega-se, então, à crítica: "Ela é necessária, isso é indiscutível. A todo momento a produção intelectual deve ser examinada, mas o mais importante, em definitivo, é a criação. A crítica deve estar a seu serviço. O problema fundamental não é o julgamento, e sim a capacidade de criar".


PEQUENO MANUAL DE INESTÉTICA. Autor: Alain Badiou. Lançamento: Estação Liberdade. Quanto: R$ 27 (192 págs.).


Texto Anterior: Lançamento: "Arte/Cidade" chega às livrarias
Próximo Texto: Um mar de "Sertões"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.