São Paulo, quarta-feira, 30 de novembro de 2005

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O OFÍCIO TEATRAL

DA REPORTAGEM LOCAL

A seguir, Paulo Autran pondera sobre o ofício que escolheu.

 

TALENTO - Talento é a característica de um artista. Se o artista não tem talento, nunca vai ser um bom artista. Por outro lado, é impossível dizer a alguém que você não tem talento. Acabei de ver isso. Fiz uma entrevista no "Dois a Um", a Mônica Waldvogel entrevistou a mim e ao Paulo Vilhena, que era um galãzinho da Globo, que não conseguia responder a uma pergunta, não entendia nada de nada. Foi uma entrevista lamentável. Sinceramente, pensei: "Este jamais vai ser um ator".
A partir dessa entrevista, esse rapaz começou a estudar. Ensaiou um peça, era o mais disciplinado, decorou o texto antes dos colegas, fez todos os exercícios, estreou e tem sido elogiado por todo mundo. Fui ver o espetáculo ["Essa Nossa Juventude", dirigido por Laís Bodanzky] e fiquei fascinado. Ele, que é um rapaz bonito, nem está bonito no palco; está exercendo a sua capacidade de ator. Eu me enganei completamente e fiquei felicíssimo com ele.

EXPERIMENTAÇÕES - Até entendo que alguém faça um teatro como o que [o diretor polonês Jerzy] Grotowski [1934-1999, criador do "teatro pobre"] fez, que era um teatro de exploração de todas as possibilidades físicas do ator, da voz, do gesto, porém, ele fazia espetáculo para 45 pessoas. Teatro é uma idéia transmitida por um ator ao público. São três elementos: público, ator e idéia. Se você suprime um, deixa de ser teatro. Se você suprime o público, então o teatro o que é? Uma masturbação para os atores gozarem, só? Para mim não é.

ESCOLAS DE TEATRO - Atualmente, existem várias escolas, a maioria é arapuca. Pessoas que prometem que vão conseguir emprego na Globo, no SBT. É tudo forjado, é mentira. Nenhum dono de escola tem esse poder. Na Globo, só trabalha quem for amigo de alguém, quem for muito bonitinho ou muito bonitinha consegue emprego lá. Mas não é com diploma de escolinha vagabunda que eles vão conseguir.

TELEVISÃO - Fiz três novelas, deixei espaço de quatro anos entre uma e outra. E, quando me perguntavam por que não queria fazer novela, eu dizia: "Para eu não enjoar de fazer televisão, e para o telespectador não enjoar de ver minha cara todo santo dia dentro de casa". Na terceira, enjoei. É muito chato.

APLAUSOS E VAIAS - Tem umas peças em que o aplauso é diferente. Tive dois tipos na minha carreira: um, totalmente diferente do outro, foi o do "Édipo Rei". Na última sílaba da peça, a platéia aplaudia em uníssono. Outro foi em "Rei Lear", que a maioria dos críticos não gostou, Bárbara Heliodora odiou. Foi a peça em que fui ovacionado em todas as sessões. É claro que os críticos vêem esse ou aquele defeito, mas o público passa por cima disso e recebe o impacto daquele texto extraordinário do Shakespeare. Normalmente, felizmente, tenho sido bastante aplaudido. Nunca recebi uma vaia na minha vida. Não sei o que é ser vaiado. Aliás, me ufano muito disso.


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