São Paulo, segunda-feira, 31 de maio de 2010

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CRÍTICA DOCUMENTÁRIO

Filme transcende dois biografados

"Godard, Truffaut e a Nouvelle Vague" é recorte da Europa entre pós-guerra e pós-1968

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Jean-Luc Godard e François Truffaut foram os autores que mais se destacaram entre os que criaram, por volta de 1960, a nouvelle vague.
Seus nomes estavam na boca de todos os que conheciam um pouco de cinema.
Em pouco tempo, influenciavam todas as discussões sobre o assunto em praticamente todo o mundo. Os dois amigos mudaram a face do cinema mundial, não há nenhuma dúvida.
No entanto, essa amizade tem uma longa, precisa e dolorosa história. Justamente essa a que se dedica "Godard, Truffaut e a Nouvelle Vague".
Poupemos o tempo do leitor apressado: para quem não gosta de cinema, o documentário de Emmanuel Laurent é supérfluo. Para quem gosta é indispensável. Através dele podemos entender um bocado mais do cinema moderno.

CINEFILIA
Primeiro, existe a amizade e a cinefilia, no começo dos anos 1950. Depois, as batalhas críticas contra o cinema francês, na revista "Cahiers du Cinéma".
Por fim, os filmes. Os curtas, os longas. As origens eram bem diferentes: Truffaut, pobre; Godard, família de banqueiros.
Mas um sustentava o outro. Truffaut (1932-1984) saiu na frente e espantou a todos em Cannes com "Os Incompreendidos", em 1959. Era tudo que queria a jovem crítica para o cinema francês: filmes vinculados ao real, ao visível, à experiência pessoal. Em suma, à verdade.
Em 1960, com o aval de Truffaut, Jean-Luc Godard lançou-se ao primeiro longa, "Acossado". Com ele surgiu a cara de um cinema totalmente revolucionário. Essa marca ficará sobre os dois: Truffaut, mais clássico, mais conservador.
Godard, sempre inquieto, questionador, perguntando sempre o que é cinema e nunca satisfeito com a resposta. Com o tempo, a inquietação de Godard tornou-se também política. Passou da direita à esquerda, do comunismo ao maoísmo. Abandonou o cinema comercial, em 1968. Afastou-se de Truffaut.
Em 1973, criticou duramente seu "A Noite Americana". Truffaut sempre soube que Godard era o melhor cineasta. Mas a pena deTruffaut era feroz: com uma carta fulminou o ex-amigo. Nunca mais se falaram.
Essa ruptura anunciara-se desde o Maio de 68, por tudo que o movimento significara. A França da nouvelle vague (ou seja: a era De Gaulle) deixara de existir; a nouvelle vague também. Deixava atrás de si rastros dos EUA ao Japão, passando pelo Brasil.

MONSTROS SAGRADOS
Mas não é apenas desses dois monstros sagrados do cinema moderno, nem da nouvelle vague que esse documentário dá conta: é também da Europa entre o pós-guerra e os pós-1968 que trata, a partir de dois de seus artistas-chave.
Não será demais lembrar que o roteirista, Antoine de Baecque, é biógrafo de Godard, de Truffaut e dos "Cahiers du Cinéma": ou seja, um importante historiador da Europa do pós-guerra. Pensando bem, esse filme não é só para quem gosta de cinema.


GODARD, TRUFFAUT E A NOUVELLE VAGUE

DIREÇÃO Emmanuel Laurent
PRODUÇÃO França, 2009
ONDE Frei Caneca Unibanco Arteplex e Reserva Cultural
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ótimo



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