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CRÍTICA
Longa não cria clima necessário ao suspense
RUY GARDNIER
ESPECIAL PARA A FOLHA
O cinema brasileiro sempre
teve uma relação muito forte
com a literatura. Nada mais natura do que adaptar a obra de Rubem Fonseca para as telas.
E "Bufo & Spallanzani" quer
ser, antes de tudo, uma homenagem ao universo ficcional de Fonseca, povoado por delegados, investigadores, gente do submundo
e do círculo das artes, com intrigas recheadas de sexo e violência.
Porém não consegue chegar a
seus objetivos. Cai presa de um
acabamento técnico em voga no
cinema brasileiro atual e acaba se
esquecendo de coisas mais importantes, como garra e energia.
Resulta num longa tecnicamente
bem feito, com atuações convincentes e uma boa história (apesar
de um ou dois deslizes de roteiro),
mas que não consegue criar a expectativa necessária ao suspense.
O filme se passa em dois tempos
diferentes, contados de forma paralela: Ivan Canabrava (José Mayer) era funcionário de uma empresa de seguros à beira de cair
num golpe milionário. Ao investigar o caso, descobre que a morte
do segurado era uma fraude. Tentando provar sua descoberta, ele
acaba vítima de uma rede de intrigas que o obriga a desaparecer
por muito tempo.
Dez anos mais tarde, Ivan é um
escritor que se esconde atrás do
pseudônimo Gustavo Flávio. Sua
amante é encontrada morta no
banco de trás do carro, num suicídio simulado. Todas as pistas de
sua morte, tanto quanto as suspeitas no golpe da empresa de seguros, conduzem ao marido dela,
que é dono da companhia.
Em sua primeira direção, Flávio
Tambellini mostra segurança na
encenação, mas o medo de errar
deixa o filme muito travado, sem
poros para respirar, como o sapo
que dá título ao longa, se jogado
na areia. Ele consegue extrair alguns belos climas noir, ajudado
pela excelente música de Dado
Villa-Lobos. Essas atmosferas, entretanto, não ajudam muito na
progressão dramática: as duas
histórias não dão interesse à trama, parecem costuradas a esmo,
sem vínculo uma com a outra.
A fotografia de Breno Silveira,
mesmo exuberante, não colabora
com a narrativa, servindo mais
como portfólio. A montagem de
Sérgio Mekler também não convence muito, desrespeitando o
tempo de cada cena e picotando
tudo à maneira do videoclipe.
Mesmo irregular em sua feitura,
"Bufo" é uma adaptação muito
mais interessante do que o trágico
"A Grande Arte", primeiro filme
de Walter Salles. Em se tratando
do escritor, a melhor transposição
continua sendo "Lúcia McCartney", de David Neves (70), um filme pungente e apaixonado. Características que faltam a "Bufo".
Ruy Gardnier é jornalista e editor da revista eletrônica "Contracampo"
Bufo & Spallanzani
Direção: Flávio Tambellini
Produção: Brasil, 2001
Com: José Mayer, Tony Ramos
Quando: a partir de hoje nos cines
Butantã, Lumière e circuito
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