São Paulo, domingo, 31 de agosto de 2008

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Televisão/Crítica

A censura parece vitimar só o imaginário

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Uma pessoa reclama por ter tido de assistir, sem prévio aviso, a um trailer do mais recente filme de Zé do Caixão. Eram cenas chocantes, diz.
Poucos dias antes podia-se ver, num programa jornalístico matinal, o vídeo da cena em que um homem, a menos de um metro de distância, pelas costas, dá um tiro na cabeça de um ex-empregado.
Não me lembro de ninguém reclamando por ter visto essa cena. Não recordo de nenhuma reação escandalizada da censura do Ministério da Justiça. A censura, assim como a sensibilidade da pessoa do trailer, parece vitimar apenas o imaginário. Um assassinato "real" pode ser visto, talvez porque seja real. Um tiro nas mesmas circunstâncias, num filme, é proibido a menores de 18 anos porque é chocante.
Pois mais vale que pessoas tão sensíveis passem longe de "Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia" (TC Cult, 11h45; não recomendado para menores de 12 anos). Pois alguém a trará -está feito o aviso. E vai executar um longo trajeto com a cabeça dentro de um saco.
Será que essa cabeça, devida ao fantástico Sam Peckinpah, vai chocar tanto quanto as diabruras, também fantásticas, do Zé do Caixão? Posso estar errado, mas esse tipo de reação visa objetos específicos. Lembra a das pessoas em transe histérico para quem o programa de rádio no qual Orson Welles, em 1938, representava a invasão da Terra por alienígenas era, de fato, o fim dos tempos.


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