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Televisão/Crítica
A censura parece vitimar só o imaginário
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Uma pessoa reclama por ter
tido de assistir, sem prévio aviso, a um trailer do mais recente
filme de Zé do Caixão. Eram cenas chocantes, diz.
Poucos dias antes podia-se
ver, num programa jornalístico
matinal, o vídeo da cena em que
um homem, a menos de um
metro de distância, pelas costas, dá um tiro na cabeça de um
ex-empregado.
Não me lembro de ninguém
reclamando por ter visto essa
cena. Não recordo de nenhuma
reação escandalizada da censura do Ministério da Justiça. A
censura, assim como a sensibilidade da pessoa do trailer, parece vitimar apenas o imaginário. Um assassinato "real" pode
ser visto, talvez porque seja
real. Um tiro nas mesmas circunstâncias, num filme, é proibido a menores de 18 anos porque é chocante.
Pois mais vale que pessoas
tão sensíveis passem longe de
"Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia" (TC Cult, 11h45;
não recomendado para menores de 12 anos). Pois alguém a
trará -está feito o aviso. E vai
executar um longo trajeto com
a cabeça dentro de um saco.
Será que essa cabeça, devida
ao fantástico Sam Peckinpah,
vai chocar tanto quanto as diabruras, também fantásticas, do
Zé do Caixão? Posso estar errado, mas esse tipo de reação visa
objetos específicos. Lembra a
das pessoas em transe histérico
para quem o programa de rádio
no qual Orson Welles, em 1938,
representava a invasão da Terra por alienígenas era, de fato, o
fim dos tempos.
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