São Paulo, sexta-feira, 31 de outubro de 2008

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CINEMA/ ESTRÉIAS

Após crise, "Rock'n'Rolla" se torna "filme de época"

Longa sobre Londres no "boom" imobiliário ficou datado com recente "crash" global

Nova obra de Guy Ritchie mostra ódio e conflitos interétnicos no Reino Unido e apresenta uma face relevante do país

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Com "Rock'n'Rolla - A Grande Roubada", o cineasta britânico Guy Ritchie transporta para o outro lado do Atlântico, mais uma vez, a fórmula inventada por Quentin Tarantino: roteiro de múltiplas histórias semi-independentes, costuradas com diálogos engraçadinhos, bandidos "espertos" e doses adolescentes de violência.
Mas há uma grande diferença entre o longa-metragem que estréia hoje no Brasil e os dois outros sucessos de público de Ritchie, "Snatch - Porcos e Diamantes" e "Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes". Sem querer, o diretor moderninho fez um filme de época.
O que move a trama -os conflitos entre diferentes grupos de criminosos e empresários, que se confundem- é uma enorme quantidade de dinheiro criada pelo "boom" imobiliário em Londres, pela grana fácil que transbordava na capital inglesa e seu centro financeiro até meados do ano passado.
Como se sabe, a maré financeira global virou. E tornou curioso ouvir de um dos "empresários" do ramo imobiliário no filme (interpretado por Tom Wilkinson) que tal tipo de mercado "só se move em uma direção": "para cima".
De resto, continuam lá os conflitos interétnicos, que já davam o mote de filmes anteriores do diretor. Há uma máfia russa -e um empresário russo caricato, Victor, interpretado pelo sérvio Dragan Micanovic- tentando passar a perna em gângsteres ingleses e seu "empresário", Lenny Cole, o personagem do típico inglês Wilkinson. As trapaças, óbvio, funcionam em mão-dupla.
Lenny Cole deixa claro que só se dobra ao convívio de imigrantes, ricos ou não, por razões estritamente financeiras. "Este é o meu país", declara a certa altura. "Eu mando nessa cidade", é outra de suas frases, logo antes de ser espancado pelos mafiosos eslavos.
Ódio interétnico, é claro, é algo corriqueiro numa cidade como Londres, um dos principais portos para imigrantes. Junte-se a isso a obsessão inglesa por status, e os típicos personagens violentos de Tarantino, que pareciam indivíduos simplesmente loucos ou desajustados, ganham uma razão maior, social, para existirem.

"Inglaterra diferente"
O título original do filme, que pode soar estranho para brasileiros, sai da ponta mais baixa da escala social britânica. "Rock'n'rolla", com "a" aberto no final, é o modo como jovens ou trabalhadores pobres pronunciam "rock'n'roller" -a palavra reúne as idéias de malandro, sujeito ganancioso, que vive a vida com total intensidade.
Os "rock'n'rolla" do filme são uma espécie de terceiro grupo, à margem das trapaças milionárias de britânicos e russos, mas tão ambiciosos quanto uns e outros. Seu mundo é menos o da trapaça que o do roubo e da violência aberta.
O mais simpático desses gângsteres é "One Two", interpretado pelo escocês Gerard Butler (do filme "300"). À Folha, Butler disse que "alguns filmes fazem você ter orgulho do seu país", em referência e elogio à obra de Ritchie.
Para ele, o diretor é hábil em apresentar "uma Inglaterra a que não estamos acostumados, uma Inglaterra violenta". De fato. Com ou sem dinheiro fácil, a raiva e a violência -sejam elas juvenis, econômicas ou interétnicas- fazem parte do cotidiano dos londrinos, e com suas caricaturas Guy Ritchie revela um país que não tolera se mostrar dessa maneira.


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