São Paulo, segunda-feira, 31 de outubro de 2011

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CRÍTICA DRAMA

"Despair" é respiro de humor de Fassbinder

35ª MOSTRA DE SP Obra de alemão associado ao pessimismo radiografa transformações sociais do país nos anos 20

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

"'Despair' é, entre os filmes que fiz, o mais cheio de esperança." A frase de Rainer Werner Fassbinder pode soar como pura provocação a respeito de um título cuja tradução significa "desespero".
Se levarmos em conta as risadas da plateia durante a primeira exibição do filme, não seria exagero reconhecer em "Despair" um raro momento de humor numa obra no geral associada a temas depressivos e sobrecarregada por uma visão pessimista da natureza humana.
Realizado em 1977, "Despair" antecede imediatamente "O Casamento de Maria Braun", filme que projetou o nome do diretor alemão ao estrelato do cinema europeu. Apesar de sua morte precocíssima, aos 37 anos, em 1982, a valorização da obra do cineasta só aumentou.
A cópia restaurada sob os cuidados do diretor de fotografia Michael Ballhaus ganhou uma projeção luminosa e uniforme na tela do Cinesesc. Hoje e amanhã, é a vez de verificar se a exibição no Arteplex alcança o mesmo patamar de qualidade.
A adaptação assinada pelo dramaturgo Tom Stoppard preserva o tema do romance homônimo de Vladimir Nabokov, cuja trama nos limites do absurdo narra as peripécias de um empresário que imagina ter um duplo na figura de um mendigo.
No filme, a ambientação desloca-se para Berlim no final dos anos 20, quando se veem espalhar a crise social e as manifestações de intolerância antissemita ligadas à ascensão do nazismo.
A situação dramática, tanto quanto a presença de atores como Dirk Bogarde e Andréa Férreol à frente do elenco, parece estranha em comparação com o repertório recorrente de temas e intérpretes que marcou a obra de Fassbinder.
A escolha de Bogarde evoca similitudes de "Despair" com "Os Deuses Malditos", no qual Luchino Visconti releu o Terceiro Reich refletido numa família de industriais alemães. Numa seleção de seus filmes favoritos, Fassbinder colocou o título de Visconti no topo da lista.
Já o tema da perda da identidade incorpora-se à ambição do cineasta de representar as transformações sociais e morais da Alemanha da década de 20 à de 70, reinterpretando o processo histórico desde o ovo da serpente que eclodiu com o nazismo até o fascismo de hoje.
A perda da identidade de Herman Herman e a projeção distorcida que conduzem o personagem ao abismo reinventam como farsa aquilo que na história real aconteceu como tragédia.

DESPAIR
DIREÇÃO Rainer W. Fassbinder
PRODUÇÃO Alemanha, 1977
QUANDO dia 31/10, às 21h50, no Frei Caneca Unibanco Arteplex 2; dia 1/11, às 15h20, idem
CLASSIFICAÇÃO 12 anos
AVALIAÇÃO ótimo


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