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LITERATURA
Escritor britânico fala à Folha sobre seu romance "Cara Massimina", que acaba de ser lançado no Brasil
Tim Parks analisa a confusa moral européia
MARCELO REZENDE
da Reportagem Local
Na quase imemorial tradição dos
satíricos britânicos está o romancista Tim Parks, que chega pela
primeira vez ao leitor brasileiro
com "Cara Massimina", um lançamento da editora Imago.
Menos conhecido -ou publicitário- que seus companheiros de
geração, como Martin Amis, Julian Barnes ou Ian McEwan, Parks
é um inglês auto-exilado em Verona, Itália, que durante anos foi
adorado pela crítica dos EUA e de
seu país, mas se manteve distante
do grande público.
Com "Europa", seu mais recente trabalho, lançado no início deste
ano, Parks conseguiu uma indicação ao Booker Prize, o prêmio literário de maior prestígio no Reino
Unido. Foi derrotado pela indiana
Arundhati Roy e seu "O Deus das
Pequenas Coisas", mas conseguiu
maior atenção. E vendas.
"Cara Massimina", editado originalmente em 1990, conta a patética trajetória de Morris Duckworth, um professor de inglês sem
muito caráter que vive sob os prazeres do sol italiano.
Duckworth dá aulas para uma
inocente e adolescente herdeira,
Massimina. Ela se apaixona por
seu mestre e ele por sua fortuna. Os
dois fogem. Massimina pensa estar
vivendo um idílio romântico. Seus
pais, pelas mensagens enviadas
por Duckworth, sabem que ela é
vítima de um sequestrador.
Em entrevista por correio eletrônico, Tim Parks falou à Folha sobre "Cara Massimina", a literatura de humor e a Europa unificada.
Leia trechos abaixo.
Folha - "Cara Massimina" é uma
obra que se prende, ainda que
com humor, à tradição do romance
policial?
Tim Parks - Obviamente, "Cara Massimina" oferece os prazeres
do "thriller" e da comédia. Por
outro lado, penso, possui um personagem "moderno", no sentido
em que ele tem uma consciência
que é fruto do modernismo. O livro se torna uma comédia, ou história de horror, em consequência
das justificativas dadas pelo personagem, um ser capaz de justificar e
ver como boas as suas piores
ações.
Morris possui a atraente qualidade de analisar com precisão as falhas de todos aqueles ao seu redor,
e isso o torna atraente para o leitor.
Ele gosta de Morris.
Folha - O enredo, a maneira que
é contado, aproxima o livro dos satíricos britânicos?
Parks - A resposta é sim. O romance pertence à longa tradição
da sátira britânica e européia, em
que a perspectiva distorcida do
protagonista desorienta o leitor,
que é forçado a descobrir quais são
as suas próprias crenças.
Folha - Um protagonista britânico vivendo na Itália e o mergulho
nos costumes da Europa. Mais do
que um romance inglês, o sr. pretendia escrever um romance europeu?
Parks - Eu escrevi "Cara Massimina" há muitos anos, pouco tempo depois de me mudar para a Itália. A influência de um "romance
europeu" não é muito forte. De
qualquer maneira, a Itália é importante. A versão italiana do catolicismo, que permite a fácil coexistência de uma fachada moral e
uma realidade muito mais amoral
(mediada pela confissão), dá a
Morris um bom campo para agir.
Minha ficção se interessa muito
por esse ponto. Não apenas as diferenças de moral entre o mundo
anglo-saxão e latino, mas os diferentes tipos de consciência que
eles geram. A obsessão anglo-saxônica (e norte-americana) com a
integridade conduz a um processo
torturante de autojustificação. Isso oferece um material melhor para a sátira.
Folha - "Europa" é também uma
sátira moral?
Parks - Escrito sete anos depois
de "Cara Massimina", "Europa"
é um romance muito diferente, influenciado pela leitura dos franceses, alemães e italianos. Mas há algo de comum. Há uma tendência
na Itália, por exemplo, em ver a
União Européia como algo bom
em si mesmo, além de qualquer
debate. E esse mesmo "bem" é
usado como justificativa para interesses pessoais. O livro vê a comunidade européia com uma face virtuosa, uma máscara que esconde
os mesmos velhos jogos.
O livro é muito inglês no ceticismo em relação às "idéias européias". Não que eu seja um antieuropeu. Sou apenas fascinado com a
ambiguidade que essas idéias ocupam na consciência européia moderna. Minha literatura é uma tentativa de mostrar essa consciência
em ação.
Folha - Nascerá, com a União Européia, um novo tipo de escritor?
Parks - Eu não acredito nessa
possibilidade, em um "escritor
europeu", sem nacionalidade. Pelo contrário. Acho que o velho paroquialismo está mais vivo do que
nunca. Existirão aqueles que serão
capazes de vencer provincianismo
e outros que ficarão presos a ele.
Vivo na Itália há 18 anos. Minha
mulher é italiana e italiano é a primeira língua de meus três filhos.
Por anos trabalhei como tradutor
e falo italiano a maior parte do
tempo. Como pode outro país, esse país, não ser importante?
Não o escolhi, no sentido em que
tinha um projeto. Eu simplesmente me apaixonei por uma mulher
em Boston que, por acaso, era italiana. É interessante pensar que
italianos e ingleses sempre definiram a si mesmos por contrastes
quando comparados uns aos outros. Sem qualquer dúvida, meu
trabalho se alimenta dessa experiência.
Livro: Cara Massimina
Autor: Tim Parks
Lançamento: Imago
Quanto: R$ 22 (247 págs.)
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