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Crítica Biografia

Obra sobre Virginia Woolf persegue seu processo criativo

Herbert Marder se concentra nos 11 anos finais da vida da escritora inglesa

ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO

Uma esnobe. Uma pacifista. Uma preconceituosa. Uma feminista. Muitos carimbos podem ser colados à imagem da escritora modernista britânica Virginia Woolf (1882-1941). Nenhum a define. Inovadora, ela deixou sua marca na literatura do século 20 com obras como "Orlando" (1928) e "As Ondas" (1931).

Produtiva, a ensaísta e editora fazia cronogramas e media sua vida pela quantidade de páginas que escrevia. Atormentada por uma condição mental que comparava com um ataque de "ratos com raiva roendo a nuca", ela sofreu. E criou com avidez.

Enquanto Hitler intensificava os bombardeios a Londres, suicidou-se mergulhando num rio vestindo um casaco com pedras nos bolsos. "Se eu não sofresse tanto, não poderia ser feliz", escreveu uma vez em seu diário.

O diário e as cartas que escrevia e recebia são a matéria-prima principal que Herbert Marder utiliza em "Virginia Woolf, a Medida da Vida".

Professor emérito de inglês da Universidade de Illinois (EUA), Marder se concentra nos últimos 11 anos de vida da escritora.

Não é uma biografia padrão. Admirador e estudioso da obra da autora, Marder, 76, mescla vida privada, crítica literária, conjuntura política e econômica para tentar compor o processo criativo de Virginia -o cerne do livro.

Escrever, para ela, é "pôr palavras nas costas do ritmo". E o escritor, para criar, precisa entrar num estado de transe, no qual "a subconsciência trabalha em alta velocidade enquanto a consciência cochila".

Marder se propôs a escrever "resistindo à tentação de impor qualquer paradigma -repressão, abuso sexual, bipolaridade", não especulando sobre fatos, mas ouvindo o que a escritora "realmente disse, não o que esperaria que ela dissesse".

E conta o que o moveu: "Minha decisão de escrever esta biografia surgiu de um fascínio pelo modo como as pessoas mudam sob grande tensão", diz no início do livro.

Com delicadeza e densidade, revela uma mulher em transformação num mundo rumo ao desastre da Segunda Guerra Mundial.

Consegue mergulhar nessa personalidade cheia de ambiguidades, que vivia "muito colada à beira" e que tinha vislumbres criativos vinculados a crises nervosas -quando se via passando "de quente para fria, sem qualquer razão, num instante".

O biógrafo começa contando a conflituosa relação entre Virginia e sua empregada para se embrenhar no universo familiar dos Woolf.

Donos de uma editora, a Hogarth Press, ela e o marido Leonard tinham uma intensa rotina de trabalho. Não eram ricos, mas conviveram com personalidades do poder e da inteligência da época.

Com o economista John Maynard Keynes eles discutiam a recessão iniciada em 1929. Com o casal de socialistas Beatrice e Sidney Webb debatiam política -ela achou Virginia "uma intelectual difícil de contentar".

Tomavam chá com o poeta T.S. Eliot para falar de filosofia, guerra e paz. Com Sigmund Freud, cuja obra era editada pelos Woolf, tiveram um encontro em 1939. O fundador da psicanálise deu a ela um narciso e fez um desabafo sobre o nazismo: seria preciso uma geração para eliminar o efeito do veneno.

As bombas nazistas começaram a cair perto dos Woolf. Virginia viu a destruição e a desolação da vizinhança e anotou: "Nós, pelo menos, estivemos na Itália e lemos Shakespeare". Um ataque arrasaria uma de suas casas e despedaçaria suas estantes.

A guerra desestruturou a editora, mas Virginia não parou de fazer planos. Ansiava pelas críticas sobre o seu trabalho. Para ela, "a arte devia ser impessoal, sem ego". Marder tenta seguir essa linha no seu livro.

Virginia Woolf, a Medida da Vida

AUTOR Herbert Marder
TRADUÇÃO Leonardo Fróes
EDITORA Cosac Naify
QUANTO R$ 77 (584 págs.)

Leia crítica de Marcelo Pen
folha.com/no1022279

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