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Peça mostra diversas facetas de Assange

"Man in the Middle", texto de Ron Elisha sobre o fundador do WikiLeaks, encerraria hoje temporada em Londres

Darren Weller, que dá vida a Julian Assange, fala da preparação para o papel, dos bastidores e da recepção da obra

RODRIGO RUSSO
DE LONDRES

No palco de um pequeno teatro no sul de Londres, perguntam ao australiano Julian Assange se os esforços para a divulgação de segredos diplomáticos valeram a pena. "Eu me faço essa pergunta há 20 anos", responde ele.

É também sem respostas claras que "Man in the Middle", que encerra temporada hoje, retrata a história da organização que Assange fundou, o WikiLeaks, e sua personalidade controversa.

O título, "O Homem no Meio", em português, alude àquele que faz a conexão entre uma complexa plataforma de dados e documentos diplomáticos e aquele que os acessará do outro lado da conexão, sem deixar rastros nesse percurso.

Em duas horas, o texto do australiano Ron Elisha dá conta de questões como transparência, honestidade e verdade, sem que Assange apareça como vilão ou herói.

A peça é construída de episódios curtos, que abordam as figuras envolvidas no caso conhecido como Cablegate - em que o WikiLeaks revelou, em fevereiro de 2010, documentos diplomáticos e vídeos até então confidenciais- e aspectos da vida pessoal do criador do site.

Estão em cena Bradley Manning, o soldado americano suspeito de vazar documentos para o site, preso desde maio de 2010, e Barack Obama, que, na peça, quer a extradição de Assange para os EUA a qualquer custo.

O personagem de Dmitri Medvedev, então presidente da Rússia, responde por boa dose de ironia na peça.

"É um ótimo adendo à história principal. Ron está mais interessado em política que no aspecto pessoal da história", diz à Folha o ator australiano Darren Weller, que interpreta seu conterrâneo Assange com habilidade.

"Ele [Ron Elisha] se interessa pelo modo como o WikiLeaks afetou o mundo em que vivemos, as pessoas que o controlam e suas reações à história. Ele é muito antiamericano, então Obama é quase um vilão da peça."

EXERCÍCIO METICULOSO

Weller conta que leu todos os livros e tomou conhecimento de todas as entrevistas de Assange para se preparar para o papel.

"Há tanto material e informação disponível. Foi um exercício meticuloso de atuação. Queria que as pessoas saíssem do teatro dizendo 'Uau, ele parece com o Assange, fala como ele'."

As diversas facetas do fundador do WikiLeaks são mostradas ao espectador.

Julian Assange aparece, então, como alguém que se vê como o arauto da liberdade de expressão e de imprensa, mas que fica indignado quando sua vida pessoal vem à tona, com as acusações de estupro na Suécia e o processo de extradição.

Ao mesmo tempo, recusa as ponderações dos jornalistas com quem trabalhava para proteger a identidade de informantes afegãos mencionados nos documentos secretos que obteve.

Há sua vida pessoal complicada, o divórcio, a relação distante com seu filho, Daniel, a fama de mulherengo e a arrogância (num discurso, proclama-se um "verdadeiro gênio", que cria suas regras).

Mas há também o hacker brilhante, o líder de uma nova plataforma jornalística, que inspira uma nova geração ao pedir mais transparência e poder para o povo.

A história da autobiografia de Assange é um dos episódios ilustrativos de suas contradições. Após aceitar fazê-la e já com o dinheiro do adiantamento, recusa a primeira versão, muda de ideia e declara que toda autobiografia é "prostituição".

A mãe de Assange, Christina, chegou a conversar com a produção da peça, que teve uma primeira versão na Austrália. "Nós tivemos contato com a mãe dele, mas durou pouco. Não protegeria os interesses de Julian o envolvimento na peça, não o ajudaria em nada", conta Weller.

O ator também disse que os produtores foram procurados por pessoas ligadas ao WikiLeaks, que queriam ler o texto -o que foi negado.

Julian Assange, que cumpre prisão domiciliar em Londres, não assistiu à peça. Weller conta, porém, que muitos fãs do WikiLeaks foram ao teatro. "Eles estavam, evidentemente, muito em prol de Assange, e chegavam a ficar bravos com alguns dos elementos da história" diz.

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