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'Quis captar o modo como nos vemos no mundo', diz Clowes

Cartunista Daniel Clowes, 50, de "Mundo Fantasma", explica as variações de seu novo trabalho, a"Wilson"

Páginas de graphic novel funcionam isoladas, com traços diferentes, mas que compõem única história

RAQUEL COZER
COLUNISTA DA FOLHA

Wilson logo avisa: ele ama as pessoas, é muito sociável e acredita que todos fazemos parte de uma grande família.

É claro que, vindo de um personagem do cartunista americano Daniel Clowes -o criador das garotas indóceis da HQ "Mundo Fantasma"-, o discurso levanta suspeitas.

Em linhas gerais, a graphic novel "Wilson", recém-lançada pela Quadrinhos na Cia., trata do sujeito mais irritante que alguém pode conhecer, reclamando de tudo e todos ao longo de 80 páginas.

Mas a obra mais recente de Clowes, 50, um dos maiores nomes dos quadrinhos alternativos americanos nas últimas décadas, é muito mais complexa do que isso.

Para começar, Wilson não tem traço definido. O personagem surge realista, com cara de desenho de livro didático, evolui para as formas arredondadas de um cartum retrô, ganha cores fortes, perde todas elas e por aí vai, transformando-se a cada página.

Clowes diz que a princípio fez assim por não se decidir por um estilo. Até notar a vantagem artística da indecisão.

"Achei que teria mais efeito se usasse vários traços, para reproduzir o sentimento de alguém pensando em si mesmo", diz o cartunista por telefone à Folha de Oakland, na Califórnia, onde vive e onde começa a história.

"Num dia você se vê sob luz negativa, no outro pensa diferente. Quis captar o modo como nos vemos no mundo."

Clowes também tomou o cuidado de fazer com que cada página isolada funcionasse como tira, com profundidade e/ou humor, mas sempre acrescentando dados importantes para a narrativa.

Por exemplo, o leitor descobre no início que Wilson faz voz de falsete, como se fosse de sua cadelinha Pepper, para afastar quem tenta afagá-la nas ruas. "Esse povo fica apavorado quando você imita voz de cachorro", diz para si mesmo o personagem.

O falsete volta quase no final, numa cena contundente. Antes, Wilson ainda constata que é perturbador ver pessoas passando direto por um mendigo morrendo, mas "babando como débeis mentais" quando veem um cãozinho.

CINEMA

Capista free-lancer da revista "The New Yorker", Clowes atualmente trabalha com Alexander Payne (diretor de "Os Descendentes") num roteiro baseado em "Wilson".

Não sabe quem protagonizará o filme, sem data prevista, e não arrisca nomes, "para depois o ator não ler no jornal que está escalado".

Em 2002, o cartunista foi indicado ao Oscar de roteiro adaptado por "Mundo Cão", o filme baseado em "Mundo Fantasma" e que tornou Scarlett Johansson famosa. Também adaptou uma história curta no filme "Uma Escola de Arte Muito Louca" (2006).

"Wilson" é a primeira graphic novel que Clowes faz para esse formato (embora ele deteste o termo "graphic novel", por achar que não condiz com o tom biográfico da maioria das obras do gênero).

Os livros anteriores reuniram quadrinhos antes serializados na revista "Eightball".

Foi o caso inclusive de "Mundo Fantasma", clássico indie lançado como livro nos EUA em 1997 e que aqui saiu só em 2011, pela pequena Gal. Comprada no Brasil em 2001 por uma editora que desapareceu sem publicá-la, a obra tinha ficado esquecida.

WILSON

AUTOR Daniel Clowes
TRADUÇÃO Érico Assis
EDITORA Quadrinhos na Cia.
QUANTO R$ 39 (80 págs.)

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