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Xeque-mate

"Lance Mortal", que ganha primeira edição no Brasil, reúne contos policiais do autor William Faulkner, morto há 50 anos

FABIO VICTOR
DE SÃO PAULO

William Faulkner, cuja morte completa 50 anos em julho, era, segundo biógrafos, um leitor voraz de histórias de crime e mistério.

"Santuário", uma de suas mais notáveis obras, foi considerado por André Malraux um casamento entre o romance policial e a tragédia grega.

E, embora o thriller não seja absolutamente o que distingue a obra de Faulkner, ele desenvolveu exercícios mais específicos neste universo.

Um deles, inédito até hoje ano Brasil, acaba de ganhar tradução de Wladir Dupont para a editora Benvirá: "Lance Mortal" ("Knight's Gambit", no original em inglês; o título se refere a uma jogada de xadrez).

O livro reúne seis contos passados na cidade de Jefferson, condado de Yoknapa-

tawpha, região imaginária de Mississippi onde o escritor ambientou sua obra.

Os enredos partem de crimes e passagens de tribunal e têm como figura central Gavin Stevens, promotor do condado e personagem recorrente no universo faulkneriano.

Stevens, ou Tio Gavin, é uma espécie de baliza moral de Yoknapatawpha, sempre em busca de seu ideal particular de justiça.

Publicado em 1949, pouco antes de Faulkner ganhar o Nobel de literatura -recebido em 1950, mas relativo a 1949, ano em que não houvera vencedor- "Lance Mortal" é tido como uma obra lateral do escritor, se comparada a clássicos como "O Som e a Fúria" e "Palmeiras Selvagens".

Segundo o acadêmico americano Noel Polk, um dos principais estudiosos da obra de Faulkner, o livro foi lançado quando o autor atravessava um período de seca produtiva no fim dos anos 1940.

Faulkner tentava sem sucesso concluir "A Fábula", que para ele seria a obra de sua vida, e escreveu histórias de maior apelo comercial como ganha-pão.

Mas, ao contrário de críticos que subestimam o trabalho, Polk diz ter grande atração pelos livros ditos "menores" de Faulkner e vê em "Lance Mortal" um laboratório do escritor para aperfeiçoar Gavin Stevens.

"São histórias engenhosas, que mostram Faulkner desenvolvendo um personagem que seria um dos mais importante na fase final de sua carreira", disse Polk à Folha.

"Não que se equipare a 'O Som e a Fúria' e 'Absalão, Absalão', mas, para mim, tudo que ele escreveu vale a pena."

Professor aposentado da Universidade Estadual do Mississippi, o acadêmico lembra que "muita tinta já foi gasta" para interpretar a posição de Gavin Stevens em Yoknapatawpha.

"Ele sente que pode se intrometer na vida do povo de 'seu' condado, que pode distribuir justiça 'a seu modo', precisamente porque ele é mais inteligente, rico e bem-educado que os outros."

PRECONCEITO

Admirador de Faulkner e autor de thrillers como "O Invasor" e "Cabeça a Prêmio", o escritor Marçal Aquino observa que, mesmo nos livros do americano que flertam com o gênero, o que sobressai é o estilo narrativo peculiar de Faulkner.

"Ainda que às vezes lidem com a violência e tenham elementos violentos, os livros dele não são violentos, têm somente uma levada policial. Acho que [as experiências na área] são mais curtição, porque não é isso que fica da obra dele. A preocupação maior é com a linguagem."

Aquino lamenta que perdure certo desdém em relação aos policiais, ainda que no gênero figurem nomes que ele lista entre os grandes da literatura do século 20, como Dashiell Hammett (1894-1961) e Raymond Chandler (1888-1959).

"O problema de um livro policial é justamente ser policial. De cara já é rotulado, visto como escapista."

PACOTE

Num pacote pelos 50 anos da morte de Faulkner, depois de "Lance Mortal" a Benvirá vai reeditar outros cinco títulos do autor. Em maio, saem "O Intruso" e "Os Invictos". Em setembro, a trilogia "Snopes": "O Povoado", "A Cidade" e "A Mansão".

Cosac Naify e José Olympio, outras duas editoras que publicam Faulkner no Brasil, informaram não ter programado lançamentos ou reedições do autor.

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